Sítio dedicado à filosofia humana, ao estudo e conhecimento da verdade, assim como à investigação. ~A Luz está a revelar a Verdade, e a verdade libertar-nos-á! ~A Chama Violeta da Transmutação
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Antes de começar a tentar identificar o Monte Sinai, precisava determinar se o relato do livro de Macabeus a respeito do esconderijo da Arca era historicamente plausível. Ele dizia que Jeremias tinha escondido a Arca na montanha onde Moisés tivera sua visão da Terra Prometida, e o relato de Levítico identificava o local como o Monte Sinai.
Como já estava convencido, Jeremias era, dentre todas, a mais provável escolha para ser o responsável pela retirada da Arca do Templo de Jerusalém, portanto não havia nada de improvável com relação a esse aspecto do livro de Macabeus…
… Mas e o Monte Sinai (na península de mesmo nome) como localização de seu (da Arca da Aliança) esconderijo secreto?
Quanto mais aprofundava minhas pesquisas, mais o Monte Sinai parecia, de fato, o lugar mais lógico para Jeremias, ou qualquer outro judeu da época, levar a Arca. De acordo com a Bíblia, o Monte Sinai era o local mais sagrado dos antigos israelitas antes do Templo de Jerusalém ser construído. Foi ali que Deus falou com Moisés pela primeira vez de cima de um arbusto em chamas; foi para lá que Moisés conduziu os israelitas depois de fugirem do Egito; e foi ali que Deus revelou aos israelitas suas leis religiosas, estabeleceu os Dez Mandamentos, e ordenou a construção da Arca.
Tudo isso pode muito bem ter sido razão suficiente para que Jeremias considerasse ali um lugar apropriado para esconder a Arca. No entanto, o Templo de Jerusalém e a montanha sagrada tinham algo em comum que parecia fazer do Monte Sinai o único lugar para onde a Arca poderia ser levada. Acreditavase que os dois lugares — e somente eles — eram habitados por Deus. No Antigo Testamento, o Monte Sinai é várias vezes chamado de a Montanha de Deus porque acreditava-se que Deus, literalmente, morava ali.
O Monte Sinai, na península de mesmo nome
Repetidas vezes, a montanha é descrita como a “santa habitação” de Deus (por exemplo, no Êxodo 15:13 e Deuteronômio 26:15) ao passo que outras referências especificam que Deus morava na montanha sagrada. Por exemplo, Êxodo 24:16 diz que “O Senhor repousou sobre o Monte Sinai.” O historiador judeu do século I, Josephus, confirma que isso não era uma metáfora e que os antigos israelitas de fato acreditavam que Deus habitava a montanha. Com relação ao lugar onde Moisés encontrou o arbusto em chamas, ele escreveu:
“Agora esta é a montanha mais alta de toda a região, e a melhor terra para pastagem, sendo ali o melhor lugar para a ervagem; e não fora assim antes de ser pastada, porque os homens de opinião acreditavam que Deus ali habitava.” (Antiguidades 1981) No entanto, após ser construído, os israelitas acreditavam que o Templo de Jerusalém era a nova “santa habitação” de Deus. No segundo livro das Crônicas, Salomão explica por que construiu o Templo: “Eu te tenho edificado uma casa para morada para ti (Deus), e um lugar para a tua eterna habitação.” (2 Cr 6:2). De acordo com 2 Crônicas portanto, o Templo de Jerusalém passava a ser, para todo o sempre, a única casa de Deus.
Diferente das noções católicas e judaicas de todas as igrejas ou sinagogas serem a casa do Senhor, para os antigos israelitas havia somente uma morada. Havia outros templos e santuários onde Deus podia ser adorado, mas só podia existir uma única “casa de Deus.” Até o momento da invasão babilônica, o Templo continuou a ser chamado de a Casa de Deus. No reinado do rei judaico Acaz, no século VIII a.C: “E ajuntou Acaz os utensílios da casa de Deus” (2 Cr 28:24).
No reino de Ezequias, no século VII a.C: “E toda a obra que começou no serviço da casa de Deus” (2 Cr 31:21). E no tempo em que os babilônios saquearam o Templo, no século VI a.C: “E queimaram a casa de Deus” (2 Cr 36:19). Com o Templo ameaçado, o Monte Sinai teria sido o lugar mais adequado para que Jeremias levasse a Arca: aquele era a outra única “santa habitação” de Deus. Entretanto, ao continuar examinando os textos do Antigo Testamento, comecei a perceber que havia uma outra, e mais convincente, razão para que Jeremias tivesse levado a Arca para o Monte Sinai.
Não era exatamente a Arca que precisava ser retirada do Templo, mas a presença de Deus (que ela continha) para a qual ela fora construída para abrigar. De acordo com o livro do Êxodo, Deus apareceu, de forma física, para os israelitas pela primeira vez no Monte Sinai:
“E disse o Senhor a Moisés: eis que eu virei a ti numa nuvem espessa, para que o povo ouça, falando eu contigo… E estejam prontos para o terceiro dia; porquanto no terceiro dia o Senhor descerá diante dos olhos de todo o povo sobre o Monte Sinai”. (Ex 19:9-11)
Não fica claro, exatamente, de que forma Deus apareceu, mas Ele de alguma forma, se manifestou dentro de uma nuvem densa de fumaça:
“E todo o monte Sinai fumegava, porque o Senhor descera sobre ele em fogo: e a sua fumaça subiu como fumaça de uma fornalha, e todo o monte tremia grandemente… E, descendo o Senhor sobre o monte Sinai, sobre o cume do monte”. (Ex 19:18-20)
Uma Cloud Ship suspensa sobre o Monte Shasta, perto de Sacramento, Califórnia, EUA. “A glória do senhor” também frequenta outras montanhas, também sagradas e em outras terras nos dias de hoje
Antes de os israelitas deixarem o Monte Sinai para continuar sua jornada pelo deserto, Deus ordenou que construíssem a Arca. Por mais estranho que possa parecer ao pensamento moderno, a Arca foi, na verdade, feita para abrigar o próprio Deus. No relato do Êxodo, Deus disse a Moisés o que fazer:
E me farão um santuário; e habitarei no meio deles. Conforme tudo o que eu te mostrar para modelo do tabernáculo, e para modelo de todos os seus pertences, assim mesmo o fareis. Também farão uma arca de madeira de acácia; o seu comprimento será de dois côvados e meio, e a sua largura de um côvado e meio, e de um côvado e meio a sua altura. (Ex 25:8-10)
A parte mais essencial parece ser a que fala do misterioso propiciatório, sobre o qual Deus podia se manifestar:
Também farás um propiciatório de ouro puro… E porás o propiciatório em cima da arca… E ali virei a ti, e falarei contigo de cima do propiciatório. (Ex 25:17-22)
A presença de Deus estava agora no interior da Arca, porque quando os israelitas deixaram o Monte Sinai, a miraculosa nuvem de fumaça pairou sobre ela:
Assim partiram do monte do Senhor caminho de três dias: e a arca da aliança do Senhor caminhou diante deles caminho de três dias, para lhes buscar lugar de descanso. E a nuvem do Senhor ia sobre eles de dia, quando partiam do arraial.(Nm 10:33-34)
Toda vez que os israelitas montavam acampamento, a Arca era colocada no tabernáculo ou “tenda da congregação” atrás de um véu ou cortina especiais. Falou mais o Senhor a Moisés, dizendo:
No primeiro dia do primeiro mês, levantarás o tabernáculo da tenda da congregação. E porás nele a arca do testemunho, e cobrirás a arca com o véu. (Ex 40:1-3)
Parece que esse véu separava o lugar sagrado da Arca do restante do tabernáculo:
Pendurarás o véu debaixo dos colchetes, e porás a arca do testemunho ali dentro do véu; e este véu vos fará separação entre o santuário e o lugar santíssimo. (Ex 26:33)
Sobre o Monte Sinai, quando Deus conversara com Moisés, apareceu sobre o pico da montanha. Agora, porém, ele apareceu onde a Arca estava, de trás do véu no tabernáculo. Sua presença, no entanto, podia ser fatal para qualquer pessoa que chegasse perto demais, conforme o irmão de Moisés, Aarão, foi avisado:
Disse, pois, o Senhor a Moisés: Dizei a Aarão, teu irmão, que não entre no santuário em todo o tempo, para dentro do véu, diante do propiciatório que está sobre a arca; para que não morra: porque eu aparecerei na nuvem sobre o propiciatório. (Lv 16:2)
Assim como no Monte Sinai, a presença de Deus sobre a Arca era chamada de a glória do Senhor — já descrita como o fogo devorador: “Então a nuvem cobriu a tenda da congregação, e a glória do Senhor encheu o tabernáculo”. (Ex 40:34).
Passagens bíblicas como essas mostram claramente que a presença de Deus, que antes acreditavam ter habitado exclusivamente sobre o Monte Sinai, era agora vista como (deus) residindo com a Arca. Assim como a barca egípcia que carregava a estátua do deus Amun quando deixava o Templo de Karnak, a Arca da Aliança parece ter sido considerada um meio de transporte de Deus — ou algo por meio do qual Deus podia se manifestar — de sua santa habitação no Monte Sinai.
Estudiosos do acampamento dos israelitas durante o Êxodo indicam que há cerca de duzentas referências à Arca da Aliança no Antigo Testamento, quase todas envolvendo o período entre o Êxodo e a construção do Templo.
Quando o Monte Sião foi, mais tarde, consagrado como uma nova montanha sagrada e o Templo de Jerusalém foi, por fim, construído para ser a “casa de Deus”, parece que a presença de Deus deixou a Arca para habitar no interior do santuário do Templo. O primeiro livro dos Reis descreve como a Arca foi carregada para dentro do Templo quando este ficou pronto: “Assim trouxeram os sacerdotes a arca da aliança do Senhor ao seu lugar, ao oráculo da casa, ao lugar santíssimo” (1 Reis 8:6). Nessa época, a Arca foi aberta pela primeira vez após muitos anos:
Na arca nada havia, senão só as duas tábuas de pedra, que Moisés ali pusera junto ao monte Horebe-Sinai, quando o Senhor fez uma aliança com os filhos de Israel, saindo eles da terra do Egito. (1 Reis 8:9) Contudo, assim que a Arca foi aberta, algo miraculoso aconteceu: E sucedeu que, saindo os sacerdotes do santuário, uma nuvem encheu a casa do Senhor. E os sacerdotes não podiam permanecer em pé para ministrar, por causa da nuvem: porque a glória do Senhor enchera a casa do Senhor. (1 Reis 8:10-11)
O Rei Salomão então explicou o que aconteceu: “O Senhor disse que ele habitaria nas trevas. Certamente te edifiquei uma casa para morada, assento para a tua eterna habitação” (1 Reis 8:12-13). Salomão está interpretando a nuvem e a “glória do Senhor” que enche o local enquanto a presença de Deus deixa a Arca para habitar, de forma permanente, no Templo.
Minha perspectiva era a de que não importava se esses episódios miraculosos ocorreram historicamente ou não. O mais importante era que os judeus no tempo da invasão dos babilônios acreditavam que sim. As escrituras sagradas garantiam que a presença de Deus havia sido levada do Monte Sinai para dentro do Templo de Jerusalém, na Arca da Aliança. Jeremias sabia que os babilônios iriam invadir Jerusalém, e que, provavelmente, destruiriam o Templo como um ato de represália. Se o Templo de Jerusalém não era mais um lugar seguro para a presença de Deus habitar, certamente teria de ser devolvida para o local de onde viera originalmente: o Monte Sinai.
O interior do Tabernáculo, contendo o Menorah sagrado, a Arca da Aliança e as oferendas e a nuvem que enchia a casa do Senhor…
Tudo que sabemos no relato do Êxodo é que o Monte fica em algum lugar no Deserto de Sinai: Ao terceiro mês da saída dos filhos de Israel da terra do Egito, no mesmo dia chegaram ao deserto de Sinai. Porque partiram de Refidim, e entraram no deserto de Sinai, onde se acamparam; Israel, pois, ali se acampou em frente ao monte. (Ex 19:1-2)A única maneira de transportar essa presença divina era por meio da Arca da Aliança. Em suma, parecia que a Arca tinha de ser levada de volta para o Monte Sinai e nenhum outro lugar. Eu estava convencido de que o Monte Sinai era o lugar mais provável para Jeremias esconder a Arca. A grande pergunta então era: onde exatamente ficava o Monte Sinai? Curiosamente, considerando-se o significado religioso da Montanha de Deus, a Bíblia não era nada transparente com relação à sua localização verdadeira.
Infelizmente, a inclusão do nome Refidim, onde os israelitas estiveram, não é de grande serventia. Esse não é o nome de um lugar; apenas quer dizer “lugar de descanso.” Foi onde os israelitas acamparam por algum tempo para se recuperarem e permitir que seus animais pastassem. Tudo que aprendemos nessa passagem é que a Montanha de Deus fica em algum lugar no Deserto de Sinai. Dentre as localizações conhecidas citadas no Antigo Testamento, podemos deduzir que a região conhecida como o Deserto de Sinai se estendia por um largo território, incluindo a atual Península de Sinai no sul do Egito, partes do sul de Israel e da Jordânia, e até mesmo, uma parte da Arábia Saudita.
Não era um deserto como o Saara, com grandes extensões de terra, mas um campo pedregoso, empoeirado e árido com vegetação esparsa, entremeado por ocasionais oásis de solo fértil. Media aproximadamente quatrocentos quilômetros de norte a sul e 350 quilômetros de leste a oeste. Isso corresponde a cerca de 55.000 milhas quadradas. Havia muitas montanhas nesse considerável espaço, e a Montanha de Deus poderia ter sido qualquer uma delas. De fato, sua verdadeira localização do período da Era cristã parece ter sido totalmente esquecida.
No século IV d.C, o primeiro imperador cristão romano, Constantino, o Grande, acreditava ter descoberto onde era o Monte Sinai. Em segredo, ele proclamou que se tratava de uma montanha específica na ala sul da Península de Sinai, no Egito. Segundo a opinião geral, ele descobriu a localização a partir de uma visão ou de um sonho de sua mãe, Helena (a mesma Helena responsável pela construção da original Igreja da Natividade). Constantino mudou o nome do lugar para Monte Sinai, e logo depois, o mosteiro de Santa Catarina foi fundado ali e rapidamente tornou-se um dos principais centros de peregrinação.
Mosteiro de Santa Catarina e ao fundo o Monte Sinai.
Mesmo hoje em dia, o mosteiro ainda é ocupado por monges que afirmam ser o prédio continuamente habitado mais antigo no mundo. Não se sabe, nos dias de hoje, o antigo nome da montanha. A maioria dos mapas ocidentais ainda se referem ao local como o Monte Sinai, ao passo que os mapas árabes o chamam de Jebel Musa — a “Montanha de Moisés”. Entretanto, apesar de o lugar ainda atrair milhares de turistas todo ano, estudiosos contemporâneos não foram capazes de descobrir nenhuma evidência bíblica ou histórica para apoiar a crença de Constantino ou de sua mãe.
Céticos com relação a Jebel Musa, uma série de arqueólogo modernos chegaram a propor outras localizações para o Monte Sinai. Uma das teorias mais recentes vem do respeitado paleontólogo italiano Emmanuel Anati, que indicou o Monte Karkom, próximo a El Kuntilla em Israel, a cerca de quarenta quilômetros ao norte de Elat. Anati, que baseou sua conclusão na descoberta ao pé da montanha dos restos de habitações circulares e de um altar cercado por doze pedras erguidas.
De acordo com Êxodo 24:4, Moisés construiu um altar e doze pilares abaixo da Montanha de Deus para representar cada uma das doze tribos hebraicas. Apesar da comoção inicial, porém, uma escavação recente datou os restos de cerca de 2000 a.C, cinco séculos antes mesmo do período do Êxodo. Uma outra teoria recente identificou a Montanha de Deus como Jebel al- Lawz, na Arábia Saudita. Em 1986 dois exploradores americanos, Ron Wyatt e David Fasold, viajaram até a montanha, na esperança de encontrar as jóias egípcias que a Bíblia diz que os israelitas levavam consigo durante o Êxodo. No entanto, foram quase que imediatamente presos por escavações ilegais, ameaçados de aprisionamento pelas autoridades sauditas, e deportados.
Sua identificação de Jebel al-Lawz como a montanha de Deus baseava-se em suas hipóteses de que o monte está localizado onde antes era a terra de Midiã. De acordo com Êxodo, foi para lá que Moisés fugiu após seu exílio do Egito. Como Jebel al-Lawz é a montanha mais alta nessa região, pareceu lógico a Wyatt e Fasold que esse seria o local de onde Deus teria se comunicado com Moisés.
Mais recentemente, uma outra dupla de exploradores americanos decidiu seguir os passos de Wyatt e Fasold. O milionário de Wall Street, Larry Williams, e o ex-policial Bob Cornuke, cruzaram de maneira ilegal o território saudita para pesquisar a montanha em busca de evidências de que aquele era, na verdade, o Monte Sinai. Ao entrar ilegalmente na área, hoje toda cercada, Williams e Cornuke procuraram correspondências com o registro bíblico.
Próximo ao pé da montanha, avistaram uma pilha de rochas que tinham desenhos de touros. Esse, Williams e Cornuke decidiram, deve ser o altar onde dizem que os israelitas adoravam o bezerro de ouro. Mais acima da ladeira, Williams e Cornuke encontraram uma enorme estrutura de pedras, perto da qual havia os restantes do que pareciam ser doze torres de pedra, cada uma com cerca de cinco metros e meio de diâmetro.
Identificaram a estrutura de pedra como o altar construído por Moisés e as torres como os doze pilares que ele ergueu ao seu redor. Diferente de seus predecessores, Williams e Cornuke conseguiram escapar das autoridades sauditas, mas suas descobertas não foram capazes de convencer seus críticos, e diversos arqueólogos questionaram sua teoria. O estudioso bíblico Allen Kerkeslager, por exemplo, ressaltou que a pilha de pedras que Williams e Cornuke identificaram como o altar do bezerro dourado — por causa das fotografias de touros — era na verdade, uma construção comum na região, que tinha como intenção, nos tempos antigos, comunicar-se por meio de mensagens que abordavam a caça e outras atividades pastoris.
O bezerro de ouro hoje esta em Wall Street
Aquilo que os exploradores identificaram como as torres de pedra, Kerkeslager sugeriu, eram aterros comuns ao longo de todo o noroeste da Arábia. Acirrados debates acadêmicos ainda cercam muitos locais propostos para o Monte Sinai, e sua verdadeira localização permanece como um dos mistérios mais contestados da Bíblia. Entretanto, quando analisei as diversas referências do Antigo Testamento a respeito da Montanha de Deus com mais cuidado, cheguei à conclusão de que ofereciam algumas pistas muito importantes que pareciam ter sido completamente ignoradas.
A Montanha de Deus é chamada por dois nomes diferentes no Antigo Testamento: Monte Sinai e Monte Horebe, ou apenas Horebe. A Bíblia não deixa dúvidas de que essas eram a mesma montanha. As leis sagradas que dizem ter sido reveladas por Deus aos israelitas na Montanha de Deus são citadas na Bíblia como “a Aliança”, e diversas vezes quando o livro de Deuteronômio fala da Aliança, refere-se a Horebe. Por exemplo: “Deus fez uma aliança conosco em Horebe” (Dt 5:2). De fato, 1 Reis 19:8 diz muito especificamente que Horebe é a Montanha de Deus. Com relação ao profeta Elias, esse versículo nos diz: “Levantou-se, pois, e comeu e bebeu; e com a força daquela comida caminhou quarenta dias e quarenta noites até Horebe, o monte de Deus.”
Por que a montanha tem dois nomes diferentes é um mistério, mas pode ter sido porque, como o próprio Deus, a montanha era considerada sagrada demais para ser chamada por seu nome. Como o termo indica, Monte Sinai apenas se refere a uma montanha no Deserto de Sinai, enquanto a palavra hebraica horeb apenas quer dizer algo como “montanha no deserto.” (Lingüistas bíblicos sugeriram que se trata de uma combinação de duas palavras hebraicas: hor, que significa “monte”, e choreb, “um lugar seco ou deserto”.
O Deuteronômio apenas uma vez se refere à montanha santa como Monte Sinai; em outras ocasiões ela é chamada apenas de “o monte” ou “monte de Deus”. Em outras palavras, nenhum desses nomes identifica um local específico; a Montanha de Deus pode ser qualquer montanha no Deserto de Sinai. O que eu precisava descobrir, era seu nome verdadeiro, o que significava ter de averiguar, com mais exatidão, onde, de fato, acreditavam ficar o monte. Havia alguma pista na Bíblia? Como acabei descobrindo, havia, na verdade, dois incidentes que diziam ter ocorrido na Montanha de Deus que indicavam uma região específica do Deserto de Sinai — não Midiã, no sul do deserto, como Wyatt e Fasold propuseram, mas Edom no norte.
O primeiro indicador que descobri foi no livro do Êxodo, na passagem que mencionava Moisés e o arbusto em chamas. De acordo com Êxodo 2:15-21, após ser forçado para o exílio do Egito, Moisés estabeleceu-se na terra de Midiã, onde se casou com a filha de um sacerdote local chamado Jetro. Alguns anos mais tarde, Moisés estava cuidando do rebanho de seu sogro quando se deparou com um arbusto que ardia em chamas sem ser consumido. Foi dentro deste fogo milagroso que Moisés ouviu, pela primeira vez, a voz de Deus.
De acordo com Êxodo 3:1, esse evento aconteceu em Horebe, a Montanha de Deus: E apascentava Moisés o rebanho de Jetro, seu sogro, sacerdote em Midiã; e levou o rebanho atrás do deserto, e chegou ao monte de Deus, a Horebe. Midiã era o nome antigo para a região leste do Golfo de Aqaba, onde hoje é o extremo noroeste da Arábia Saudita. Exatamente como os beduínos de hoje, os povos de Midiã eram de pastores nômades. Grupos de famílias inteiras conduziam seus rebanhos de ovelhas e cabras por centenas de quilômetros no prazo de um ano por todo o Deserto de Sinai até o norte de Midiã, sempre em busca de terrenos bons para a pastagem dos animais.
Parece que era isso o que Moisés estava fazendo quando se deparou com o arbusto em chamas. Se o deserto citado no versículo acima era o Deserto de Sinai, as palavras “atrás do deserto” — onde a Montanha de Deus ficava sob a perspectiva de Midiã — deveria ficar no extremo norte da região. Isso seria em algum lugar da região hoje chamada de Deserto de Negev, ao sul da Jordânia — uma terra que nos tempos bíblicos era chamada de Edom. A segunda pista da localização da Montanha de Deus, eu encontrei depois no relato do Êxodo. Após Moisés voltar para o Egito e comandar os israelitas à liberdade, voltou com eles para Horebe para mais uma vez se comunicar com Deus na montanha santa.
Quando lá chegaram, os israelitas estavam sem água e mortos de sede. Moisés, porém, salvou-os com um milagre: Então disse o Senhor a Moisés, Passa diante do povo, e toma contigo alguns dos anciãos de Israel; e toma na tua mão a tua vara, com que feriste o rio, e vai. Eis que eu estarei ali diante de ti sobre a rocha, em Horebe; e tu ferirás a rocha, e dela sairão águas e o povo beberá. (Ex 17:5-6)
Embora essa passagem específica não nos dê pista alguma com relação à localização exata de Horebe, o mesmo incidente é citado no livro dos Números: Então Moisés tomou a vara de diante do Senhor, como lhe tinha ordenado… Então Moisés levantou a sua mão, e feriu a rocha duas vezes com a sua vara; e saiu muita água; e bebeu a congregação e os seus animais. (Nm 20:9-11)
Essa passagem não diz que o incidente ocorreu na Montanha de Deus — e é por isso que dá a impressão de não ter sido percebido — mas fica claro que se trata do mesmo evento. No entanto, alguns versículos depois, ficamos sabendo onde ele aconteceu. Assim que os israelitas conseguiram se refrescar, Moisés envia um mensageiro para pedir permissão ao rei local para poder passar por suas terras: Depois Moisés, de Cades, mandou mensageiros ao rei de Edom, dizendo: Assim diz teu irmão Israel… Deixa-nos, pois, passar pela tua terra. (Nm 20:14-17)
A passagem do Êxodo diz que o episódio da água milagrosa da rocha aconteceu em Horebe, a Montanha de Deus, ao passo que a passagem dos Números nos diz que esse mesmo evento aconteceu em Kadesh (Cades). Em hebraico, a palavra kadesh significa “santidade”, ou nesse contexto “um lugar sagrado”, Parece, então, que esse não é o nome do lugar, mas apenas uma descrição. A tradução do inglês deveria ter sido “Moisés, do lugar sagrado, mandou mensageiros ao rei de Edom”. Entenderíamos, então, que este versículo simplesmente se refere à Horebe, a Montanha de Deus. Embora a exata localização de Kadesh (Cades) seja um mistério, o local deve ficar em algum lugar na fronteira da terra de Edom, porque Moisés tenta conseguir permissão do rei de Edom para continuar sua viagem.
Fica bastante-claro, portanto, se o atual Antigo Testamento estiver certo, que a Montanha de Deus fica na terra de Edom, ou pelo menos, próximo a ela — uma terra onde hoje fica o sul da Jordânia. Enquanto estudava atentamente os antigos mapas na Biblioteca Nacional, examinei os detalhes da região em busca de idéias quanto à localização da montanha que os autores do Antigo Testamento podem ter chamado de Monte Sinai ou Monte Horebe — e para onde Jeremias teria levado a Arca. Uma cadeia de montanhas no sudoeste da Jordânia passa bem no meio do lugar que outrora fora a terra de Edom — as Montanhas de Shara. Será que uma dessas montanhas teria sido citada pelos autores do Antigo Testamento como o Monte Sinai ou Horebe?
Edom era um pequeno reino no noroeste do Deserto de Sinai. A arqueologia mostrou que o lugar foi habitado por um povo semita conhecido como os edomeus de cerca de 1700 a.C. até a área ser ocupada pelos nabateus da Arábia no século IV a.C. Das inúmeras descobertas, ficou determinado que os edomeus migraram para o sul de Canaã, por volta do mesmo período em que os outros semitas (incluindo, ao que parece, os israelitas) se estabeleceram no Egito. Os edomeus tinham, na época, uma relação de parentesco com os israelitas, e isso, somado à sua migração para o Deserto de Sinai, parece estar refletido na história do Antigo Testamento de Jacó e Esaú.
De acordo com o livro do Gênesis, Jacó e Esaú eram irmãos que viviam em Canaã, porém, separados porque Jacó enganou Esaú, fazendo com que ele perdesse seus direitos à herança. Jacó e sua família se mudaram para o leste do Egito, onde seus descendentes passaram a ser os israelitas, enquanto Esaú se mudou para o sul em Edom, onde seus descendentes se transformaram nos edomeus. Embora isso, sem dúvida, seja uma simplificação, uma parábola de eventos, testes de DNA nos restos esqueléticos dos israelitas e dos edomeus mostraram que eles, de fato, possuíam uma ancestralidade comum.
Ao ler o relato do Gênesis de Esaú se estabelecendo na terra de Edom, imediatamente, fui surpreendido por algo muito interessante — a passagem fazia referência a uma montanha em específico ao redor da qual os edomeus viveram: “Portanto Esaú habitou na montanha de Seir… E estas, pois, são as gerações de Esaú, pai dos edomeus, na montanha de Seir” (Gn 36:8-9). O Monte Seir é citado uma série de vezes no Antigo Testamento, e quando li as diversas referências, percebi que estava prestes a descobrir algo importante.
Parecia que, como o Monte Sinai, o Monte Seir era considerado uma montanha santa associada a Deus. No livro de Isaías, o profeta Isaías (por volta de 700 a.C.) diz que, quando Deus fala com ele, “Gritam-me de Seir” (Is 21:11). Deus, ao que tudo indica, chamava o profeta do lugar onde morava, no Monte Seir. Uma outra passagem do Antigo Testamento, mais adiante, sugere que acreditava-se que Deus residia no Monte Seir, porque quando Deus foi invocado pelos israelitas, Ele mais uma vez respondeu ao chamado daquela montanha. No entanto, essa passagem, na verdade, parece relacionar o Monte Seir ao Monte Sinai. Juízes 5:4-5 traz a súplica: O Senhor, saindo tu de Seir, caminhando tu desde o campo de Edom, a terra estremeceu, e os céus gotejaram, as nuvens também gotejaram águas.
Os montes se derreteram diante do Senhor, e até Sinai diante do Senhor Deus de Israel. O que a ligação entre as duas montanhas possa significar é difícil de entendermos somente com essa passagem. Entretanto, Deuteronômio inclui um versículo que parece indicar que as duas montanhas são, na realidade, uma só. Quando Moisés estava morrendo, ele pediu a Deus que viesse e abençoasse os israelitas, e “o Senhor veio do (Monte) Sinai e lhes subiu do (Monte) Seir” (Dt 33:2). Como mencionei, o Antigo Testamento, com freqüência, apresenta dois nomes quando se refere ao Monte Sinai.
Quando Moisés visitou o Monte Sinai pela primeira vez no episódio do arbusto em chamas, por exemplo, ele é descrito na Bíblia de grande circulação do Rei James como tendo ido para “o monte de Deus, a Horebe” (Ex 3:1). Como vemos, o autor usa ambos os termos, “Monte de Deus” e “Horebe” para se referir ao lugar. Da mesma forma, o autor da passagem de Deuteronômio parece estar usando ambos os nomes, Sinai e Seir, para falar da montanha santa. O Monte de Deus certamente parecia estar localizada na terra de Edom, em algum lugar entre as Montanhas de Shara. Pelo menos, é nisso que os escribas do Antigo Testamento que compilaram os relatos importantes entre 650 e 500 a.C. parecem ter acreditado.
Tudo indica, também, que ao menos alguns desses escribas acreditavam que o Monte Seir e o Monte Sinai eram o mesmo lugar. Posso muito bem ter reduzido a amplitude da área citada como sendo o Deserto de Sinai onde ficava a montanha sagrada. Entretanto, ainda havia um problema. A exata localização do Monte Seir era um mistério para os estudiosos bíblicos, da mesma forma que o Monte Sinai. Qual das Montanhas de Shara era o Monte Seir?
Nos tempos medievais, certas fontes naturais eram consideradas sagradas, visto que acreditava-se que suas águas continham propriedades de cura. Geralmente, a Igreja consagrava uma fonte em homenagem a um santo em particular e construía um pequeno santuário sobre ela, transformando-a em um poço sagrado.
O poço onde Jacob Cove-Jones afirmava ter encontrado a mão de chumbo era um desses lugares. Localizado a cerca de um quilômetro ao norte da Igreja de Burton Dassett, ele está, hoje, coberto por uma construção de pedras retangulares e lisas do século XVII, com aproximadamente três metros de comprimento por dois metros de largura e um metro e meio de altura.
“E a arca da sua aliança foi vista no seu templo; e houve relâmpagos, e vozes, e trovões, e terremotos e grande saraiva”. Livro do Apocalipse 11:19
Um lance de degraus nos leva de uma abertura inferior à frente, para dentro de um tanque vazio, com cerca de um metro abaixo da superfície. Essa parte mais baixa é muito mais antiga do que o restante da estrutura e existe desde a época da construção da Igreja de Todos os Santos. Imagina-se que foi em algum lugar ali que Jacob Cove-Jones fez sua descoberta. Infelizmente, a estrutura mais baixa do poço estava em condições tão ruins que era impossível dizer se, algum dia, existiu um compartimento secreto naquele lugar, como afirmou Cove-Jones.
Posso não ter conseguido encontrar evidências no poço que me ajudassem a determinar a verdade, ou mentira, da descoberta de Cove-Jones, mas não estava propenso a descartar suas afirmações com base nas mesmas alegações de seus contemporâneos. Embora tenham, originalmente, datado a mão de chumbo como do mesmo período da construção inicial do poço, os especialistas, posteriormente, decidiram que Cove-Jones a havia comprado na loja de antiguidades e que inventou a história toda de tê-la achado no poço.
O museu local, ao que parece, por fim, decidiu que a suposta descoberta era uma farsa, simplesmente porque Cove-Jones se recusara a explicar como os murais da igreja tinham-no levado até ela. Embora isso fosse compreensível, eu tinha a impressão de que o homem tinha outros motivos para manter seu segredo: ele estaria defendendo seu achado. Cove-Jones pode muito bem ter imaginado que se revelasse o que havia descoberto dos murais na igreja, outros iriam tomar posse dos detalhes de sua pesquisa e passariam a procurar os tesouros.
Suas razões podem muito bem explicar que seu desejo não era enganar as pessoas, como o museu local acreditava, mas simplesmente o de querer preservar seu interesse próprio. Ele podia apenas estar esperando até que conseguisse encontrar mais coisas antes de desvendar todos os detalhes do que descobrira. Se essa fosse a verdade, os resultados não teriam passado de uma infeliz questão de interesses. A reação de Cove-Jones de ter sido rotulado como uma fraude o fez não apenas manter suas descobertas para si, como também ter feito tudo que estivesse ao seu alcance para esconder seus achados.
Uma outra razão que levou o museu e outras pessoas a se recusarem a levar Cove-Jones a sério foi a bem elaborada trilha do tesouro que ele criou. Se ele tinha, de fato, encontrado os outros artigos que dizia ter achado, então, por que não mostrá-los ao mundo? Por que escondê-los novamente e em seguida criar uma insana trilha de pistas? O Sr. Baylis achava que aquela era a forma encontrada por Cove-Jones para perturbar seus historiadores contemporâneos. No entanto, havia uma outra possibilidade.
Era comum, durante o final do século XIX, ver colecionadores de riquezas de antigas relíquias esconder uma ou mais de suas valiosas propriedades no final de uma trilha de mensagens codificadas como uma espécie de epitáfio pessoal, guardada para que gerações futuras pudessem decifrá-las. Na verdade, eu mesmo havia seguido uma dessas trilhas, que me levou até um pequeno cálice de ônix, que o proprietário vitoriano acreditava ser o original Santo Graal. Na realidade, as pistas criadas por Cove-Jones eram muito parecidas.
Naturalmente, as autoridades do museu podiam estar certas a respeito de Cove- Jones. Não havia como saber com certeza. Contudo, se ele havia inventado tudo aquilo, por que escolher uma mão de chumbo como o artefato no poço? Era um objeto nada comum impossível de ser identificado por outras pessoas. Cove-Jones era um homem rico, e portanto, se ele tivesse decidido comprar um artefato em uma loja de antiguidades, como o museu acreditava, por que ele não teria escolhido algo mais espetacular e adequado, como uma antiga tigela de prata ou um cálice de ouro?
O que quer que fosse a mão, não podia ser um dos itens da capela de Herdewyke da época de Ralph de Sudeley, que — de acordo com a teoria de Cove- Jones — eram os tesouros que as pistas dos murais o levaram a encontrar. O Sr. Baylis havia me garantido que a mão tinha cerca de 650 anos de idade, porque sua mãe a tinha avaliado na década de 80. Especialistas em arte que a examinaram na época, disseram que seu método de produção era, sem dúvida alguma, do estilo das obras da metade do século XIV.
Obviamente, Cove-Jones pode ter tido todos os tipos de motivos que eu nem poderia imaginar, mas pelo que vi, não tinha a menor possibilidade de simplesmente descartar suas alegações, como os especialistas haviam feito. Contudo, se Cove-Jones havia encontrado a mão de chumbo no poço depois de decifrar os murais da igreja, o que ela representava? Apesar do artefato não ser uma das supostas relíquias que ficaram expostas na capela da preceptoria de Herdewyke, o objeto sem dúvida parecia corresponder as pinturas na igreja.
Acima e abaixo das duas pessoas que seguravam o cálice e a cabeça cortada, havia desenhos espirais vermelhos, muito parecidos com a espiral de prata na palma da mão. Se a descoberta era verdadeira, obviamente, esses simbolismos tinham de ter algum significado que indicasse os Templários de Herdewyke. Quando vi os espirais pela primeira vez na igreja, tinha certeza de já ter visto algo daquele tipo. Foi somente depois de revelar as fotos que tinha tirado no Vale de Edom que percebi do que se tratava. Em uma cordilheira de pedras que ficava na metade dos degraus que nos conduziam a Jebel Madhbah, havia uma alcova entalhada na lateral do penhasco que tinha um bloco de pedra esculpido, que acreditavam ser um altar dos edomeus.
Igreja Templária de Todos os Santos construída em torno de 1330, os templários conseguiram o dinheiro para construir uma nova igreja em Burton Dassett.
Tinha tirado uma foto da alcova que mostrava que, ao lado da pedra do altar, havia um desenho entalhado na rocha — uma impressão de duas espirais entrelaçadas. Ao ver a fotografia, perguntei a diversos historiadores e arqueólogos se sabiam dizer qual era o significado das espirais, mas ninguém tinha explicação alguma. Se o pictograma fosse da mesma época do altar, o símbolo poderia ser relacionado à religião dos edomeus, que tinha alguma ligação com sua montanha sagrada. Se isso fosse verdade, essa seria mais uma conexão entre Jebel Madhbah e os Templários de Herdewyke.
Infelizmente, não havia como sabermos, com certeza, a idade dos espirais de Jebel Madhbah; eles podiam até ter sido grafitados por um turista dos dias de hoje. Apesar de tudo, os espirais me deixaram intrigado. Foi quando perguntei a um senhor, que conheci na Igreja de Burton Dassett, se ele tinha alguma idéia do que os espirais no mural representavam, que uma perspectiva totalmente nova se abriu com relação às minhas pesquisas a respeito dos segredos da Arca perdida.
Eu tinha voltado à igreja e estava ocupado tirando alguma fotos dos murais, quando uma voz vindo de minhas costas me fez saltar surpreso. “Essas são algumas das mais antigas decorações de igrejas no país.” Voltei minha atenção e me deparei com um homem de estatura baixa, que usava uma barba e tinha cabelos grisalhos com cerca de sessenta anos de idade. “É.. sim. Tem algum problema se eu tirar algumas fotos?” eu disse, surpreso por não estar mais sozinho no local. O lugar ecoava com estardalhaço, porém eu não o tinha ouvido se aproximar.
“Fique à vontade”, ele disse com um sorriso. Deduzi que devia ser o guarda responsável pela igreja, quando começou a acender as velas do altar e me deixou continuar a tirar as fotos. “Você faz alguma idéia de qual o significado dos murais?” Perguntei a ele quando terminei. O homem me respondeu praticamente tudo o que eu já sabia a respeito dos desenhos terem confundido muitos especialistas, até que lhe perguntei o que ele achava que os espirais representavam. “Essa é só minha simples teoria, mas eu acho que têm alguma ligação com as aparições no poço“, ele disse, chamando-me para que o acompanhasse até o lado de fora.
Paramos próximo ao poço enquanto ele me contava como algumas pessoas haviam tido visões miraculosas de santos e anjos relatadas naquele local durante a Idade Média. “As pessoas até hoje vêem coisas estranhas aqui, embora não as considerem mais como milagres”, ele disse. Ouvi com grande interesse quando ele começou a contar a respeito de uma ocorrência que fora relatada por um antigo vigário. Uma noite, o vigário estava saindo de casa do outro lado da estrada quando notou um brilho vermelho vindo de dentro da estrutura do poço. Ele estava prestes a começar a investigar o que podia ser aquilo, quando teve um dos maiores sustos de sua vida.
Uma bola de luz vermelha como fogo, que descreveu como tendo cerca de trinta centímetros de diâmetro, saiu do poço e flutuou pela estrada, a alguns metros do chão. Quando a bola chegou no pilar do portão próximo à entrada da casa dele, ela soltou um estouro forte e algo, que parecia a faísca de um relâmpago em miniatura, saiu de dentro dela e pôs fogo no portão de madeira. Enquanto o vigário assistia àquilo em choque, a bola de luz misteriosa encolheu ficando do tamanho de uma bola de tênis e saiu em disparada pelo ar em movimentos espirais, desaparecendo de vista no céu escuro. “Eu conheço várias pessoas que dizem ter visto essa luz estranha”, disse o homem. “O que ela é — quem pode dizer? Mas eu deduzo que era essa mesma aparição que as pessoas nos tempos antigos achavam que eram anjos ou santos.”
O homem conseguiu me deixar mais estupefato do que podia imaginar. O que ele descrevia parecia ser exatamente as estranhas bolas de luz relatadas em Jebel Madhbah. “Você disse que achava que essas aparições tinham alguma ligação com os murais?” eu perguntei. “Sim. As pessoas que viram a luz, geralmente a descrevem como algo que desaparece no ar com um movimento espiral. Você sabe, o mesmo que acontecia quando brincávamos com aquelas estrelinhas de fogos de artifício na infância. O ponto de luz que se espalha em alta velocidade deixa uma imagem visual circular em nossos olhos. Eu acredito que as pessoas que pintaram os espirais nos murais estavam tentando representar o que tinham visto.
“Claro que eles achavam que aquilo era um milagre.” Eu ia perguntar ao homem se ele próprio já tinha visto a luz, mas ele disse que precisava cuidar de alguma coisa na igreja e voltou para dentro. Por algum tempo, examinei a estrutura do poço mais de perto e fui até o outro lado da estrada para dar uma olhada no pilar do portão que, pelo que diziam, tinha sido posto em chamas pela estranha luz. O portão, porém, parecia ter sido trocado recentemente. Depois de quase dez minutos, voltei a igreja, na esperança de poder conversar mais com o homem a respeito da luz, mas ele não estava mais lá dentro. Caminhei ao redor do cemitério por alguns instantes em busca do homem, mas ele devia ter terminado seus trabalhos e ido embora. O homem, com certeza, tinha conseguido me deixar confuso.
Minhas pesquisas em busca da Arca da Aliança haviam me levado até um lugar onde um fenômeno exatamente igual ao de Jebel Madhbah tinha sido reportado. Seria isso apenas uma extraordinária coincidência? Eu tinha de descobrir mais a respeito da estranha luz no poço. Surpreendentemente, quando comecei a pesquisar na biblioteca pública na cidade do condado de Warwick, descobri que estranhas luzes parecidas com aquela tinham sido vistas por todos os cantos das Colinas de Burton Dassett. Achei dezenas de recortes de jornais relatando todos os tipos de luminosidades misteriosas: esferas, colunas e picadas de luz, geralmente de cor vermelha ou laranja, mas às vezes azul. Todas tinham sido vistas nas colinas, nas florestas e até mesmo na área do Templo de Herdewyke.
Os fenômenos pareciam acontecer em ondas, elevando-se por vários dias após períodos de chuva intensa, antes de desaparecerem novamente, às vezes durante anos. Por causa das centenas de relatos, cientistas da Universidade de Oxford investigaram as ocorrências na década de 1990 e concluíram que se tratavam de fenômenos eletromagnéticos causados pelo estrato das rochas e correntes subterrâneas. As Colinas de Burton Dassett são cobertas de granito cornalina, e uma pequena falha geológica cruza toda a região. Tudo indicava que as rochas do lugar produziam o mesmo geoplasma enigmático encontrado em Jebel Madhbah, que acreditavam ser criado por uma combinação de atividade sísmica e água corrente, embora ocorram com mais freqüência nas Colinas de Burton Dassett quando as chuvas são mais fortes.
Os relatos das estranhas luzes vistas em Jebel Madhbah pareciam muito semelhantes com as descrições do Antigo Testamento da “glória do Senhor” e do “fogo devorador” que surgiu no Monte Sinai. Muitos dos relatos das testemunhas das luzes ao redor das Colinas de Burton Dassett também pareciam assustadoramente semelhantes aos relatos bíblicos das manifestações divinas na Montanha de Deus. Um homem que entrevistei pessoalmente era o professor primário de Warwickshire, Simon Bowen. Ele havia testemunhado um fenômeno incrível enquanto voltava para casa em sua motocicleta pela estrada de terra deserta do condado que passa ao lado do curral que tinha sido a capela dos Templários. De repente, e sem explicação, seu motor parou e o farol apagou-se. Ele começou a procurar uma lanterna em seu alforje, quando percebeu que a estrada estava ficando misteriosamente iluminada.
Toda a área foi banhada por um brilho avermelhado que vinha de uma moita de arbustos na lateral da estrada. A princípio, ele achou que o arbusto estava pegando fogo, mas de repente, uma esfera de luz vermelha brilhante, com alguns centímetros de diâmetro, se ergueu acima das folhas. Ficou suspensa por alguns segundos antes de diminuir e se transformar em um ponto de luz que disparou em direção ao céu em um movimento espiral, desaparecendo na escuridão. Não pude deixar de me lembrar do primeiro encontro de Moisés com a presença do Senhor na Montanha de Deus: ‘E apareceu-lhe o anjo do Senhor em uma chama de fogo do meio duma sarça: e olhou, e eis que a sarça ardia no fogo, e a sarça não se consumia. (Ex 3:2)”.
Uma sarça (arbusto) que queimava sem ser consumida! Parecia ser exatamente a mesma coisa que Simon Bowen achava ter visto. Naturalmente, o Sr. Bowen não achou que estivesse vendo um anjo, mas muitas testemunhas das luzes de Burton Dassett, durante muitos anos, interpretaram o fenômeno em um contexto religioso. Por exemplo, um globo de luz azul visto por habitantes do vilarejo de Farnborough, na extremidade sudeste das Colinas de Burton Dassett, no século XV, acharam que aquilo era uma visão da Virgem Maria; algo descrito como uma chama flutuante vista sobre um lago das redondezas durante a I Guerra Mundial foi considerado como um anjo; e, há pouco tempo, em 1986, uma esfera brilhante iridescente que apareceu do lado de fora da igreja Pentecostal ao norte das colinas, foi considerada como uma visita do Espírito Santo.
Obviamente, os mesmos fenômenos que ocorreram em Jebel Madhbah estavam acontecendo nas Colinas de Burton Dassett. Apenas alguns poucos lugares no mundo apresentam a combinação certa de geologia, atividade sísmica e de precipitações que criam o geoplasma. Certamente, era mais do que uma simples coincidência que um fenômeno raro como esse pudesse ocorrer em dois lugares que estavam relacionados com Ralph de Sudeley e seus Templários.
Jebel Madhbah pode, originalmente, ter sido considerada sagrada, por causa das estranhas luzes vistas no local — fenômenos vistos como manifestações de Deus. Era bastante possível que os Templários posicionados no Vale de Edom tivessem visto essas luzes e também as tivessem considerado como algum tipo de aparição divina. Será que Ralph De Sudeley e seus Templários decidiram construir sua preceptoria no pé das Colinas de Burton Dassett porque sabiam que fenômenos semelhantes aconteciam ali?
Na verdade, os Templários de De Sudeley podem ter considerado Jebel Madhbah como tendo sido a Montanha de Deus e acreditavam que essas estranhas luzes seriam a “glória do Senhor” descrita no Antigo Testamento. Os Templários que se estabeleceram no Vale de Edom, certamente sabiam que a região tinha associações bíblicas porque mapas das Cruzadas contemporâneas se referem à região como Le Vaux Moise — “o Vale de Moisés”. Além disso, o santuário de Ain Musa dos beduínos já estava lá quando os Templários chegaram, o que significa que os Templários deviam saber que ali era o lugar que acreditavam que Moisés tinha criado a fonte milagrosa. Sendo assim, é possível que eles tenham chegado à conclusão de que Jebel Madhbah era a Montanha de Deus. Se tinham conhecimento da Bíblia (e como muitos deles eram monges, imaginamos que isso fosse natural), eles sabiam que Moisés havia criado sua fonte na “rocha em Horebe”.
Como Horebe era um dos nomes do Antigo Testamento para a Montanha de Deus, não teria sido preciso muita imaginação para que chegasse à conclusão de que o santuário de Ain Musa ficava na base do lugar que deve ter sido essa mesma montanha santa. Quando os sarracenos forçaram os Templários a abandonar o Vale de Edom, um outro lugar onde acreditava-se que “a glória do Senhor” se manifestava seria o local perfeito para construir uma nova preceptoria. Além disso, se os Templários de De Sudeley tinham encontrado o que acreditavam ser relíquias bíblicas no pé de Jebel Madhbah, a capela na base das Colinas de Burton Dassett seriam o lugar sagrado ideal para guardá-las. Para eles, as Colinas de Burton Dassett podem ter sido a nova Montanha de Deus.
Enquanto continuava a investigar as estranhas luzes ao redor das Colinas de Burton Dassett, comecei a suspeitar de que estava seguindo por um caminho muito mais significativo. Parecia que esses fenômenos peculiares podiam, na realidade, estar escondendo o segredo que desvendaria um dos maiores mistérios a respeito da Arca da Aliança — o que ela, de fato, tinha sido. De acordo com o Antigo Testamento, a glória do Senhor apareceu muitas vezes sobre e ao redor da Montanha de Deus, mas, assim que os israelitas deixaram a região, a mesma glória do Senhor continuou a aparecer para eles. Agora, porém, ela vinha da Arca. Por exemplo, Levítico 9:23 descreve como, depois da Arca ser colocada no interior do santuário do tabernáculo, a presença de Deus se manifestou: Então entraram Moisés e Aarão na tenda da congregação, e depois saíram, e abençoaram ao povo: e a glória do Senhor apareceu a todo o povo.
Quando a Arca era consultada no tabernáculo, não somente a glória do Senhor, mas uma nuvem miraculosa, às vezes, aparecia. Por exemplo, o livro dos Números diz que os israelitas “virando-se para a tenda da congregação, eis que a nuvem a cobriu, e a glória do Senhor apareceu” (Nm 16:42). Dizem, ainda, que essa nuvem pairava sobre a Arca quando ela era levada de um lugar a outro: A arca da aliança do Senhor caminhou diante deles em uma jornada de três dias, para lhes buscar lugar de descanso. E a nuvem do Senhor ia sobre eles de dia. (Nm 10:33-34) Ao que tudo indica, durante a noite, a manifestação era vista em forma de fogo e, durante o dia, em forma de uma nuvem. Êxodo 13:21 descreve a aparição do Senhor da seguinte maneira: “E o Senhor ia adiante deles, de dia numa coluna de nuvem para os guiar pelo caminho, e de noite numa coluna do fogo “.
As luzes de Burton Dassett foram relatadas durante horas de escuridão, mas um outro fenômeno também estranho foi visto durante o dia. Ele foi descrito como uma “pequena nuvem que paira logo acima do chão”, “uma coluna de névoa”, e “uma bola de fumaça que dança”. Na verdade, uma testemunha que eu mesmo consegui entrevistar, deu uma descrição que parecia ser tirada do Antigo Testamento. O lago próximo ao vilarejo de Farnborough, onde a chama flutuante foi vista durante a I Guerra Mundial, é também o lugar de dezenas de relatos tanto das luzes estranhas como da misteriosa coluna de névoa. Gary Selby, um pescador amador da cidade de Oxford, estava pescando com dois amigos em um dia de verão de 1999 quando os patos no lago, de repente, começaram a voar.
Sem saber o que os havia surpreendido, os três homens olharam do outro lado da água e viram-se diante de um espetáculo estranho. Aquilo que Gary descreveu como uma coluna do tamanho de um homem de névoa cinza escura desceu do céu e ficou pendurada, sem se mexer, acima do centro do lago. Ela permaneceu ali por alguns instantes e, então, começou a se movimentar para frente e para trás, cerca de trezentos metros nas duas direções, antes de girar como um pequeno tornado e desaparecer no ar. De acordo com o livro do Êxodo, Moisés viu algo muito parecido quando Deus se manifestou da Arca no tabernáculo: “E sucedia que, entrando Moisés na tenda, descia a coluna de nuvem, e punha-se à porta da tenda” (Ex 33:9).
Tanto a estranha névoa quanto as bolas de fogo e as colunas de luzes, foram relatadas muitas vezes sobre o lago de Farnborough, e assim como as descrições bíblicas da glória do Senhor, elas podem muito bem ser o mesmo fenômeno visível, de formas diferentes, durante o dia e na escuridão. Especialistas explicaram os fenômenos como algo chamado de gás do pântano: vapores liberados das vegetações apodrecidas que podem, às vezes, desencadeá-los. No entanto, é difícil imaginarmos como o gás do pântano, submetido à ação da direção dos ventos, possa se mover de duas formas diferentes. Parecia mais provável que a estranha névoa estava, de alguma forma, relacionada com a aparição de geoplasma que acontecia durante o dia; somente na escuridão, ela seria vista como uma forma de brilho.
Como vimos anteriormente, é bastante possível que os relatos bíblicos da glória do Senhor visto no Monte Sinai fossem, na verdade, descrições de fenômenos geoplasmáticos e que o mesmo fogo divino era, de alguma maneira, produzido pela Arca da Aliança. Há indicações de que o geoplasma possa ser uma fonte de energia alternativa — para indústrias de combustíveis, de fornecimento de energia, proporcionando inclusive um meio de viagem interestelar. Atualmente, pesquisas científicas acerca do fenômeno estão apenas no início, e seu poder está longe de ser utilizado. No entanto, se a glória do Senhor era, de fato, o geoplasma, parece que Moisés sabia exatamente o que fazer para controlá-lo. Percebi que estava lidando com coisas fora do comum, mas não pude deixar de imaginar se a Arca da Aliança seria, na verdade, algum tipo de mecanismo geoplasmático.
A equipe de cientistas da Universidade de Oxford que tinha estudado as luzes de Burton Dassett havia conduzido experimentos semelhantes aos realizados pelo Departamento de Minas e Energia dos Estados Unidos em 1981, comprimindo os núcleos do granito cornalina e do arenito para produzir geoplasma de baixo nível. Consegui entrar em contato com o Dr. James Mellor, um dos responsáveis pelos experimentos da equipe, e perguntei a ele se seria possível criar um aparelho que reproduzisse artificialmente o fenômeno em uma escala maior.
“Seria preciso uma máquina gigantesca para comprimir a quantidade de rocha necessária”, ele me disse ao telefone. “Seria algo totalmente impraticável. Poderia ser possível produzir artificialmente as luzes da terra (o termo popular que a equipe de Oxford usava para o geoplasma) sem a necessidade de um compressor de bombardeamentos de elétrons e de um campo magnético forte o suficiente. No entanto, a única maneira de comprovar essa teoria, no momento, seria por meio do uso de um acelerador de partículas, mas não existem muitos disponíveis no mundo.” “Você acredita que seria possível, no futuro, criar um aparelho portátil para produzir o geoplasma?” eu perguntei.
O Dr. Mellor respondeu-me que sim, se a energia solar pudesse ser controlada por meio da criação de células de silício fotoelétricas que convertessem a luz do sol em eletricidade suficiente. Infelizmente, ele explicou, nós ainda temos que descobrir o que fazer para maximizar a conversão da energia solar em elétrica. “Se isso pudesse ser feito, qual seria o aspecto de um gerador geoplasmático?” eu perguntei. “Não faço a menor idéia”, ele disse, “mas seria preciso que houvesse um núcleo de granito cornalina ou de arenito e que fosse isolado por um policarbonato espesso ou uma camada grossa de chumbo ou de ouro.”
Embora esses detalhes pudessem desapontar um cientista, eu estava perplexo. O Dr. Mellor poderia estar descrevendo a Arca da Aliança. Ela tinha um revestimento folheado a ouro e guardava tábuas de arenito. A Bíblia nos conta o que havia na Arca quando foi aberta no Templo de Jerusalém: “Na arca nada havia, senão só as duas tábuas de pedra, que Moisés ali pusera junto a Horebe” (1 Reis 8:9). Essas duas tábuas de pedra, nas quais dizem que Deus inscreveu os Dez Mandamentos, foram, ao que tudo indicava, cortadas da rocha do topo do Monte Sinai. (De acordo com o Êxodo, Moisés quebrou as duas primeiras tábuas e Deus pediu que ele próprio cortasse outras duas da rocha exposta no cume do Monte Sinai.)
E ele (Deus) deu a Moisés, quando acabou de falar com ele no monte Sinai, as duas tábuas do testemunho, tábuas de pedra, escritas pelo dedo de Deus (Ex 11:18). O cume de Jebel Madhbah é composto de arenito, que, assim como o granito cornalina das Colinas de Burton Dassett, é uma das poucas rochas que sabe-se ser capaz de produzir o geoplasma. A importância das tábuas sagradas pode não ter sido apenas pelo fato de trazerem os mandamentos de Deus, mas também por terem sido feitas de um determinado tipo de pedra. Naturalmente, não havia nenhuma descrição bíblica de algo que pudesse conter células de silício fotoelétricas, mas uma parte muito importante da Arca ainda permanecia sem ser mencionada — o misterioso propiciatório.
Seria possível que os antigos israelitas tivessem, de alguma forma, encontrado algo que, atualmente, não passa de um processo de física teórica de tecnologia de ponta, e criado um gerador geoplasmático? O que quer que fosse, se podemos acreditar na Bíblia, a Arca da Aliança produzia algo que era incrivelmente semelhante aos fenômenos das Colinas de Burton Dassett e de Jebel Madhbah. Além disso, ela poderia ser extremamente perigosa, assim como a luz relatada pelo vigário de Burton Dassett, que descarregou o que parecia ser energia elétrica e pôs fogo no pilar de seu portão. Uma passagem do Antigo Testamento descreve algo muito parecido vindo da Arca: “Porque o fogo saiu de diante do Senhor, e consumiu o holocausto e a gordura, sobre o altar” (Lv 9:24).
O fenômeno das Colinas de Burton Dassett pode ser ainda mais destrutivo, como aconteceu em 1931, quando uma bola de fogo em chamas se chocou contra um moinho de vento, incendiando-o e destruindo-o por completo. O dono do moinho e sua esposa quase perderam suas vidas. Quando a glória do Senhor apareceu para os antigos israelitas, alguns deles não tiveram tanta sorte: “E o fogo do Senhor ardeu entre eles, e consumiu os que estavam na última parte do arraial” (Nm 11:1). O que quer que fosse esse fogo divino, os israelitas, aparentemente, sabiam o que fazer para controlá-lo. O versículo seguinte dessa história descreve como Moisés impediu a devastação: “Então o povo clamou a Moisés; e Moisés orou ao Senhor, e o fogo se apagou” (Nm 11:2).
Diversas vezes, a Arca não apenas foi usada para se comunicar com Deus, mas também como uma arma apavorante. De acordo com o Antigo Testamento, Deus instruiu os israelitas para encontrarem um reino hebraico em Canaã, uma terra já ocupada por dezenas de diferentes povos hostis que eram muito mais populosos que eles. Para conseguir superar obstáculos tão surpreendentes, o incrível poder da Arca foi usado para esmagar carruagens, derrubar muralhas de cidades e derrotar exércitos inteiros, até que somente um inimigo restou: os poderosos filisteus.
Os misteriosos murais para cada lado da janela norte do transepto na igreja Templária em Burton Dassett com o desenho da espiral acima.
Em uma série de batalhas decisivas, que finalmente fizeram com que os israelitas estabelecessem seu reino de Israel, a Arca é usada para destruir seus oponentes finais. De acordo com o primeiro livro de Samuel, os filisteus, inicialmente vencem, até que a Arca é usada: E quando as pessoas chegaram ao arraial, os anciãos de Israel disseram… Permita-nos pegar a arca da aliança do Senhor e levar até nós, para que, quando a coloquemos entre nós, possa ela nos salvar da mãos de nossos inimigos. (1 Sm 6:2-3)
Ainda mais pertinente para nossos propósitos, o fogo divino que emanava da Arca não era uma ocorrência aleatória, mas era um ato invocado de forma deliberada pelos israelitas. Moisés, por exemplo, chamou o poder de Deus da Arca para destruir seus inimigos: Acontecia que, partindo a arca, Moisés dizia, Levanta-te, Senhor, e dissipados sejam os teus inimigos; e fujam diante de ti os odiadores. (Nm 10:35). Parece, então, que os antigos israelitas tinham não somente criado algo que agia de forma muito semelhante a um gerador geoplasmático, mas também o utilizavam como uma arma futurista de destruição em massa. Entretanto, não havia como saber o que de fato era a Arca da Aliança, a menos que ela pudesse ser encontrada.
Eu podia não ter provas de que De Sudeley e seus Templários tinham, na verdade, encontrado a Arca em Jebel Madhbah, mas havia evidências razoáveis de que haviam achado um baú dourado que acreditavam ser uma relíquia bíblica. Essa mesma relíquia poderia muito bem estar entre os objetos guardados na Capela de Herdewyke. Jacob Cove-Jones afirmava ter encontrado (e escondido novamente) algumas dessas mesmas relíquias, que incluíam “uma descoberta de imensa importância”. Era possível que esse fosse o mesmo baú dourado. Ele, obviamente, havia deixado pistas que levavam até seu próprio esconderijo no vitral da igreja no vilarejo de Warwickshire de Langley. Eu tinha de ver o vitral com meus próprios olhos.
A localização e a topografia de Jebel Madhbah (Petra) certamente pareciam se
encaixar com a Montanha de Deus da Bíblia. Além do mais, havia fenômenos naturais
raros no local que podiam muito bem explicar os eventos milagrosos que cercavam a “aparição de Deus” na montanha sagrada.
No entanto, se Jebel Madhbah era, realmente, o Monte Sinai descrito no Velho Testamento, então, os lugares sagrados que Moisés associou a Deus já estavam sendo usados pelos edomeus…
“E a arca da sua aliança foi vista no seu templo; e houve relâmpagos, e vozes, e trovões, e terremotos e grande saraiva”. Livro do Apocalipse 11:19
… Isso me deixava com duas questões importantes. A Bíblia parecia retratar os edomeus como um povo hostil que praticava uma idolatria pagã. Como os israelitas conseguiram ganhar acesso a Jebel Madhbah e, ainda mais importante, por que eles queriam isso? Por que acreditariam que um espaço religioso dos edomeus era um lugar onde seu próprio Deus habitava? Para solucionar esse dilema, precisava, antes de mais nada, examinar a série de eventos que levou os israelitas até a Montanha de Deus.
A divisa dos Templários: “Non nobis domini, non nobis sed nomini tuo da gloriam”-Não a nós Senhor, não a nós, mas ao Teu nome glorifique.
De acordo com o livro dos Números, quando os israelitas chegaram em Cades, no lugar que parece ter sido a entrada do Siq na extremidade sudoeste do Vale de Edom, Moisés criou a fonte milagrosa em Horebe, a Montanha de Deus. Ele,
então, enviou uma mensagem para o rei dos edomeus pedindo permissão para entrar em suas terras. Entretanto, o rei recusou seu pedido: “Assim recusou (o rei de) Edom deixar passar a Israel (os israelitas) pelo seu termo: por isso Israel se desviou dele” (Nm 20:21). Deste versículo, parece que os dois povos não estabeleceram nenhum acordo e os israelitas tiveram que voltar. De meu próprio passeio até Jebel Madhbah, sabia que o único caminho para subir na montanha era por dentro de Wadi Musa.
Os israelitas precisariam ter encontrado uma rota alternativa para entrar no vale — o que parece ser, exatamente, o que eles fizeram. No versículo seguinte, os israelitas se dirigem para um lugar diferente: “E os filhos de Israel, toda a congregação, viajaram de Cades e chegaram ao monte Hor” (Nm 20:22). Mais adiante em Números, em um resumo do mesmo episódio, lemos que o Monte Hor estava localizado em uma outra parte das fronteiras de Edom: “E partiram de Cades, e acamparam-se no monte Hor, no fim da terra de Edom” (Nm 33:37). Embora o Antigo Testamento não diga especificamente onde era o Monte Hor, ele parece estar localizado na outra extremidade do Vale de Edom. Também de acordo com os Números, logo após os israelitas chegarem ao Monte Hor, o irmão de Moisés, Aarão, morreu na montanha e dizem que foi enterrado ali (Nm 20:25-29).
O historiador judeu Josephus, não tinha dúvidas de que a montanha na qual o profeta Aarão morreu era uma montanha que proporcionava uma vista panorâmica do lugar que, em seu tempo, era a cidade de Petra: E quando ele chegou em um lugar que os árabes estimam como sua metrópole, que era antes chamada de Acre, mas hoje tem o nome de Petra, neste lugar, que era rodeado de montanhas altas, Aarão subiu em uma delas ficando à visão de todo o exército, Moisés tendo lhe avisado de sua morte… e morreu enquanto a multidão olhava para ele. (Antiguidades 1981).
Os beduínos do sul da Jordânia há muito tempo consideram essa montanha como Jebel Haroun — a Montanha de Aarão — que fica na extremidade noroeste de Wadi Musa. Assim como Ain Musa, a Fonte de Moisés no pé de Jebel Madhbah, os árabes locais marcam o referido local da tumba de Aarão com um santuário. Logo abaixo do cume, sobre um penhasco abrupto, está erguida uma pequena mesquita camuflada sobre uma caverna onde dizem que Aarão foi enterrado. E uma construção simples com uma cúpula e uma inscrição em arábico em cima da porta, que diz que o templo foi erguido pelo Sultão do Egito há quase oitocentos anos. Mapa 7: O vale de Edom Se Jebel Haroun era o Monte Hor, parece então, que os israelitas, após não terem conseguido acesso para o Vale de Edom pelo sul, viajaram ao redor da montanha até a outra extremidade do vale e atravessaram as montanhas ao noroeste.
Embora o Antigo Testamento não nos ofereça detalhes dos eventos, parece que os israelitas, de alguma forma, conseguiram derrotar os edomeus — talvez por meio de um ataque surpresa — e ocuparam o Vale de Edom. Em Números, Deus promete que os israelitas irão superar os edomeus: “E Edom será uma possessão, e Seir, seus inimigos, também será uma possessão; pois Israel fará proezas” (Nm 24:18). Se o Monte Seir era o nome dado pelos edomeus ao Monte Sinai, como parece ter sido, podemos deduzir que os israelitas não tiveram dificuldades para dominar o monte santo junto com tudo o mais que pertencia ao reino.
O Êxodo também relata como os israelitas superaram os edomeus e ocuparam suas terras: Então os príncipes de Edom se pasmaram… Espanto e pavor caiu sobre eles… até que o teu povo (os israelitas) houvesse passado (por Edom)… Tu os introduzirás, e os plantarás no monte da tua herança, no lugar que tu, ó Senhor, aparelhaste para a tua habitação, no santuário, ó Senhor, que as tuas mão estabeleceram. (Ex 15:13-17)
Na verdade, essa passagem não apenas confirma que acreditavam que os israelitas tinham conquistado o Vale de Edom; ela também nos dá o motivo da invasão — para que pudessem ocupar uma montanha que é, sem dúvida, a Montanha de Deus. Uma montanha que Deus criou para ele próprio habitar! Que outro lugar seria esse, se não o Monte Sinai? Curiosamente, a passagem chega inclusive a mencionar “o santuário” na montanha. Santuário, é a palavra especificamente usada no Antigo Testamento para dois outros lugares: o sacrário interno do tabernáculo e o Sagrado dos Sagrados no Templo de Jerusalém — ambos os santuários nos quais acreditavam que Deus habitava. Se Jebel Madhbah era o Monte Sinai, então, esse Santuário deve certamente ter sido o santuário dos edomeus no pico da montanha.
Tudo indicava, então, que os israelitas tiveram que conquistar Edom para que pudessem adquirir a Montanha de Deus. Eles, obviamente, não estavam em uma posição segura o suficiente para permanecer no controle da região por muito tempo, porque logo partiram do vale e continuaram sua viagem pelo Deserto de Sinai. No entanto, ainda restava um mistério. Por que, Moisés, ou os antigos israelitas, teriam considerado um lugar religioso dos edomeus como o lar de seu próprio Deus? A resposta parecia ser pelo fato de que as duas religiões compartilhavam de uma origem comum. Na verdade, eles podem, inclusive, ter venerado o mesmo Deus. Como sabemos, testes de DNA recentes de restos esqueléticos antigos mostraram que os edomeus e os israelitas estavam intimamente relacionados.
Até mesmo o Antigo Testamento admite que os dois povos eram descendentes de ancestrais comuns. Embora a Bíblia mostre os edomeus como adoradores pagãos, evidências históricas desafiam com seriedade essas alegações. Pouco se sabe a respeito dos detalhes da religião dos edomeus, porque nenhum registro desse povo existe, mas sim antigos relatos dos gregos que mencionam os edomeus no período em que seu vale estava sendo incorporado pelos nabateus no século IV a.C. A partir desses documentos, ficamos sabendo que os edomeus tinham apenas um deus, que eles chamavam de Dhu-esh-Shera — que quer dizer “Senhor do (Monte) Seir”. Esse título mostra que, como os israelitas, os edomeus eram monoteístas e que ainda veneravam o mesmo deus como faziam há muitos séculos.
Além disso, o uso de um título para sua divindade, ao invés de um nome, torna-os ainda mais íntimos dos israelitas. Na realidade, muitos dos costumes dos edomeus foram especialmente compartilhados (adotados pelos) com os judeus contemporâneos. Eram proibidos de consumir sangue (o que significa que as carcaças dos animais tinham de ser preparadas por meio dos rituais de retirada de sangue); não tinham permissão para possuir escravos; e não podiam trabalhar por um dia inteiro durante a semana.
Dentre todas as outras culturas do Oriente Médio da época, somente os judeus preparavam comidas kosher (seguindo os preceitos religiosos judaicos), abominavam a escravidão e cumpriam os costumes do Sabá. A partir de uma perspectiva histórica, a religião dos edomeus era muito mais semelhante à religião dos israelitas do que os autores do Antigo Testamento admitem. Também não há evidências arqueológicas que comprovem que os edomeus eram idólatras, como a Bíblia afirma. Muitas terras dos edomeus foram escavadas ao longo dos anos, mas nenhuma estátua ou esfinge de um deus jamais foi encontrada.
A descrição do Antigo Testamento de os edomeus como um povo ateu, estava obviamente errada e é provável que tenha se originado da animosidade entre os edomeus e os judeus na época em que o Antigo Testamento foi escrito, principalmente pelo fato de os edomeus terem se recusado a ajudar os judeus quando os babilônios invadiram seu espaço no século VI. A inimizade resultante pode ser vista com clareza nas diversas denúncias contra os edomeus nos livros do Antigo Testamento a respeito do período babilônico e podem ter prejudicado a imagem dos edomeus nos tempos mais antigos. Ficava claro, portanto, que não havia razão alguma para que os antigos israelitas não considerassem um lugar dominado pelos edomeus como um espaço sagrado de seu próprio Deus. De todas as formas e para todos os fins, a religião dos edomeus e dos israelitas era a mesma.
Eu estava agora ainda mais convencido de que Jebel Madhbah era a Montanha de Deus. Se estivesse certo, a Arca da Aliança poderia ter sido escondida ali, em algum lugar dentro de uma caverna secreta. O único problema era: onde? A montanha media mais de trezentos quilômetros quadrados em sua base e tinha mais de novecentos metros de altura. Para darmos uma volta completa ao redor de sua base era preciso uma viagem de quase vinte e quatro quilômetros. Seria necessária uma equipe gigantesca de arqueólogos, geólogos e alpinistas experientes trabalhando por meses para vasculharmos toda a montanha. Mesmo que tivesse todos os recursos para organizar uma expedição dessas proporções, as chances de encontrarmos algo pareciam, no mínimo, remotas, porque o relato dos Macabeus havia dito que Jeremias selara a entrada da caverna.
Se a caverna tinha conseguido permanecer intocada, podemos imaginar que uma rocha ou outras pedras bloqueavam sua entrada. Durante minha jornada pelo Siq e pelo Siq Externo, a apenas alguns quilômetros ao redor da base da montanha, eu vira dezenas de pilhas de rochas apoiadas contra a lateral dos penhascos, sendo que cada uma delas poderia estar escondendo entradas de cavernas. Para remover os entulhos de apenas uma dessas barragens seria preciso horas de trabalho, mesmo com o uso de pesadas engrenagens de elevação, visto que a maioria das montanhas estaria totalmente inacessível a esses equipamentos. Na verdade, quanto mais pensava no assunto, via as chances se reduzindo a nada. Os nabateus passaram anos esculpindo e trabalhando nos penhascos de Jebel Madhbah, entrando em lugares bastante profundos das rochas para construir suas tumbas.
Se a Arca da Aliança estivesse escondida em uma caverna em Jebel Madhbah, esses antigos construtores de tumbas podem muito bem tê-la encontrado há muito tempo. No entanto, enquanto contemplava as probabilidades de os tesouros do Templo já terem sido encontrados foi que eu, de repente, me lembrei do que Abdul havia me dito sobre o Cofre. Eu não havia dado muita importância naquele momento, mas Abdul me dissera que os Cruzados haviam encontrado um tesouro em uma caverna nos arredores do monumento. Obviamente, entre o tesouro havia artefatos de ouro. Não pensei, por um só instante, que esses artefatos pudessem incluir a Arca mas, sem nada mais que me fizesse dar continuidade, decidi fazer mais perguntas a ele sobre isso.
Infelizmente, Abdul sabia muito pouco além do que já havia me dito, mas ele me apresentou um historiador australiano que estava hospedado em um dos hotéis locais. Jonathan Warren —conhecido por Jack— estava trabalhando em uma tese de doutorado acerca da história de Petra e sabia tudo a respeito da descoberta dos Cruzados. Quando me encontrei com ele em seu hotel, vi que poderia ter algumas respostas. Ele me contou que não existia nenhum registro contemporâneo da suposta descoberta dos Cruzados, mas a mais antiga referência histórica do fato era datada do início de 1800.
Aparentemente, a história havia sido contada para o explorador suíço Johannes Burckhardt, que foi o primeiro ocidental a visitar as ruínas da cidade de Petra depois que os Cruzados abandonaram seus fortes, em 1189. A cidade de Petra havia decaído sob o Império Romano, e quando os árabes da região foram convertidos ao Islã no século VII, todo o vale fora abandonado.
Os Cruzados (soldados católicos da Europa) ocuparam o vale por algum tempo e construíram uma série de fortes, mas desde então, a antiga cidade foi esquecida pelos europeus até que foi redescoberta por Burckhardt, totalmente por acidente, em 1812. O desígnio original de Burckhardt era o de descobrir a fonte do Rio Nilo, algo que ainda não havia sido feito por nenhum ocidental. Na realidade, nenhum europeu havia sequer tentado realizar uma expedição daquelas, pelo fato de existir grande animosidade entre os muçulmanos e os cristãos desde a época das Cruzadas, nas guerras medievais travadas entre os europeus católicos e os árabes muçulmanos pelo controle do Oriente Médio. Um europeu viajando pelo norte da África no início do século XIX era considerado um ato suicida. Para se preparar para sua expedição sem acompanhantes, portanto, Burckhardt passou três anos aprendendo a falar o idioma arábico e estudando o Islã a fim de conseguir se passar por um comerciante muçulmano.
Com o término de seus estudos, e passando a usar um nome árabe, ele pegou um barco até a Turquia, onde começou sua árdua jornada ao sul pela costa do Mar Mediterrâneo, mantendo um diário secreto durante a viagem. Em 1812, Burckhardt estava viajando pelo Deserto de Negev com uma caravana que ia para o Cairo, quando começou a ouvir histórias a respeito das ruínas de uma magnífica cidade escondida cm algum lugar nas Montanhas de Shara. Sua curiosidade foi despertada e ele conseguiu uma desculpa para fazer um desvio em sua viagem, e em agosto daquele ano, tornou-se o primeiro ocidental, por mais de meio milênio, a entrar no Vale de Edom e ver as ruínas de Petra. Acompanhado por um guia beduíno, Burckhardt cavalgou pelo Siq e entrou no Wadi Musa, onde se deparou com o extraordinário monumento do Cofre.
Em seu diário, escreveu que seu guia lhe contou a respeito da lenda do tesouro supostamente encontrado pelos Cruzados europeus pouco antes de serem forçados pelos árabes a deixar a região. Ele não afirmou especificamente onde o tesouro havia sido encontrado, mas disse o que, supostamente, fora descoberto. “Se me lembro bem, os tesouros incluíam jóias e um baú de ouro”, Jack me disse após ter terminado seu relato da jornada de Burckhardt. Meus ouvidos logo se voltaram para menção do baú de ouro. A Arca da Aliança poderia ser descrita como um baú de ouro. Jack pôde notar que eu parecia mais que interessado no artefato. “Eu não levaria essa história tão a sério”, ele disse. “Ela foi provavelmente inventada pelos Cruzados. O nome completo do monumento arábico é Khaznat al-Faroum, que quer dizer ‘o Cofre do Faraó’. Um mito dos beduínos diz que o faraó do Êxodo perseguiu os israelitas ali na época em que Moisés criou a fonte Ain Musa, por alguma razão trouxe seu tesouro consigo, e por alguma outra razão, igualmente desconhecida, deixou-o ali naquele monumento.
Em Petra, na Jordânia, a enorme entrada do Al Khazneh (tradução árabe para “O Cofre/Tesouro”) é um dos maiores monumentos de Petra. A data da construção desse monumento é desconhecida, sendo atribuído, porém, a algo entre 200 a.C.e 100 D.C.
Uma outra lenda diz que os israelitas emboscaram o faraó no Siq e roubaram seu tesouro; eles o esconderam aqui.” Jack disse que sua opinião era que a história do tesouro do faraó foi inventada pelos Cruzados e não pelos muçulmanos locais. “Os Cruzados estavam obcecados para encontrar as relíquias bíblicas”, ele disse. Na realidade, Jack duvidava que houvesse alguma verdade na história dos Cruzados de terem encontrado o tesouro. “Eles possivelmente roubaram algumas jóias e outras bugigangas de ouro durante suas investidas e inventaram a história de que as descobriram no Wadi Musa — em um lugar que era associado a Moisés e ao Antigo Testamento. Supostas relíquias bíblicas eram capazes de fazê-los ganhar uma boa fortuna quando voltassem para casa.”
Pelo que eu podia perceber, Jack não fazia a menor idéia de que Jebel Musa podia ter sido a Montanha de Deus; ele considerava a história da fonte Ain Musa como apenas um dos muitos contos milagrosos que relacionam Moisés a lugares por todo o Deserto de Sinai. Pelo que eu sabia, porém, a história era mais convincente. Há muito tempo aprendi a contemplar a importância de mitos e lendas associadas aos locais antigos e estava preparado para descobrir o centro da verdade na história do tesouro do faraó. De acordo com a Bíblia, o ouro usado para construir a Arca e os outros recipientes sagrados que Moisés instruíra os israelitas a fazer havia sido “empreitado” dos egípcios antes de deixarem o Egito. Fizeram, pois, os filhos de Israel conforme a palavra de Moisés; e pediram aos egípcios jóias de prata, e jóias de ouro, e roupas. E o Senhor deu ao povo graça aos olhos dos egípcios, e estes lhe davam o que pediam. E despojaram aos egípcios. (Ex 12:35-36)
Muito tempo antes, porém, o faraó decidiu ir atrás deles: Sendo, pois, anunciado ao rei do Egito que o povo fugia: e mudou-se o coração do Faraó e dos seus servos contra o povo, e disseram, Por que fizemos isso, havendo deixado ir a Israel, para que não nos sirva? E aprontou o seu carro, e tomou consigo o seu povo. (Ex 14:5-6) Será que a lenda do tesouro do faraó surgira por causa de alguma confusão a respeito de uma história que se referia aos recipientes do Templo que haviam sido construídos originalmente séculos antes do ouro do faraó?
O próprio Cofre certamente não foi construído pelo faraó egípcio, pelos israelitas, ou por quem quer fosse, antes do século XIV a.C. Não era preciso uma escavação arqueológica para mostrar que o monumento datava de tempos muito mais adiantes. Sua arquitetura fora obviamente influenciada pelos gregos e romanos que não existiram até muito tempo depois de mil anos após o Êxodo parecer ter ocorrido.
Contudo, era possível que o Cofre tivesse sido construído no local de uma estrutura ainda mais antiga. Talvez os edomeus tivessem construído um santuário na lateral do penhasco, do outro lado do Siq quando ergueram o Terraço dos Obeliscos e o santuário no pico de Jebel Madhbah. Eles certamente devem ter considerado o estranho efeito acústico do vento no desfiladeiro como sendo uma manifestação sagrada. Se isso de fato aconteceu, o lugar onde o barulho era criado — ou seja, a área ao redor do que hoje é conhecido como o Cofre — teria sido considerada santa.
O livro dos Números do Antigo Testamento se refere ao que parece ter sido o Siq como Cades, que em hebraico quer dizer um “lugar sagrado”. E quando Moisés chegou pela primeira vez na Montanha de Deus, durante o episódio do arbusto em chamas, ficou sabendo que o lugar já era santo. Moisés ouve uma voz que lhe diz: “Não te chegues para cá; tira os sapatos de teus pés; porque o lugar em que tu estás é terra santa” (Ex 3:5).
Assim como os edomeus criaram os impressionantes santuários religiosos nas rochas brutas do cume de Jebel Madhbah, parecia bastante razoável que também tivessem criado um templo de pedras onde o Cofre hoje existe. Contudo, mesmo que houvesse um antigo santuário dos edomeus na extremidade do Siq, os antigos israelitas provavelmente não conseguiram manter suas relíquias sagradas naquele lugar por muito tempo. De acordo com a Bíblia, os recipientes acompanharam os israelitas durante suas viagens no Deserto de Sinai. Jeremias, porém, pode muito bem ter considerado aquele lugar como sendo um esconderijo ideal se desejasse esconder algumas dessas relíquias sagradas em Jebel Madhbah para salvá-las dos babilônios. Será que existia qualquer prova de uma antiga estrutura no lugar?
Jack se ofereceu para me acompanhar até o Cofre e me dizer o que os arqueólogos haviam descoberto a respeito do monumento. Abdul havia me dito que acreditava-se que o Cofre era uma tumba, mas Jack duvidava que o lugar fora, algum dia, usado como um túmulo. Não fora encontrado ali nenhuma inscrição dos nabateus, dos gregos ou dos romanos, comuns nas diversas outras tumbas no Wadi Musa. Tampouco havia evidências no local de sarcófagos ou de nichos próprios para o enterro de cadáveres.
“Uma coisa é certa”, ele me disse, enquanto olhávamos em direção à fachada decorativa da estrutura que é tão grande quanto a do Taj Mahal. “O Cofre foi construído para impressionar. Esse é o primeiro monumento que os visitantes vêem quando entram no vale.” Do lado de dentro, porém, o Cofre era um tanto desapontador. Embora haja um enorme corredor de entrada que deve ter levado anos para ser aberto nas rochas sólidas, o lugar era um cúbico vazio, frio e simples, sem nenhum tipo de ornamento.
As tumbas na região de Petra.
Três câmaras menores surgiam do lado de dentro, mas eram, também, igualmente simples. “Parecem ter sido construídas para fins religiosos e não práticos”, disse Jack quando parou e pegou um punhado de pedras do chão em frente à entrada. “Esses são restos de uma inundação. Toneladas desses materiais foram jogadas desfiladeiro abaixo durante tempestades torrenciais com o passar dos séculos.” Jack explicou que uma escavação organizada pelo Ministério de Antiguidades da Jordânia na década de 1980 mostrou que o chão do vale, na época em que o Cofre foi construído, há cerca de dois mil anos, era muito mais baixo do que hoje.
A entrada do monumento ficava três metros acima da lateral do penhasco, mas não havia evidências de nenhum degrau usado para subir. O lugar não poderia ter sido criado para ser usado com finalidades práticas porque a entrada exigiria uma escada. Um prédio usado para cobrança de impostos ou outro fim administrativo, como algumas pessoas sugerem, parece estar fora de cogitação. Como também não parece ter sido usado como uma tumba, algum outro propósito religioso para o Cofre parece ser a opção mais plausível.”
Jack continuou me explicando como os escavadores conseguiram penetrar nos restos deixados pelas inundações em frente ao Cofre, até que conseguiram chegar ao nível onde o chão do vale ficava no tempo em que os mais antigos edomeus ocuparam a região, que eles determinaram por meio de testes de radiocarbono que dataram ossos de animais encontrados no meio das pedras. Nessa camada, os arqueólogos acharam provas de uma camada na rocha a uma profundidade ainda maior de cerca de seis metros, diretamente abaixo da entrada do Cofre. Era uma passagem, com aproximadamente um metro e vinte de largura e um metro e meio de altura, que levava a uma câmara plana que media quase três metros quadrados com dois metros de altura.
“Essa pode ter sido uma tumba dos edomeus, porque a entrada estava parcialmente fechada com rochas colocadas de forma proposital”, disse Jack. “No entanto, parecia que o lugar fora roubado há muitos séculos, porque não havia nada em seu interior.” “Você acha que poderia ser a caverna do tesouro encontrada pelos Cruzados?” eu perguntei. “Eles poderiam ter escavado o local por algum motivo, mas, como disse, acredito que tenham inventado toda essa história.”
Eu tinha de descobrir mais sobre os Cruzados que haviam ocupado a área, antes de chegar a qualquer conclusão a respeito daquela história. Mesmo que os Cruzadores tivessem encontrado tesouros ali, seriam eles os vasos do Templo escondidos por Jeremias? Será que essa era a caverna mencionada no livro de Macabeus? Não fiquei surpreso ao saber que havia uma construção dos edomeus do lado oposto do Siq: ela se encaixava em minha teoria com relação às associações sagradas do lugar. Jack disse que achavam se tratar de uma tumba, mas poderia muito bem ter sido um santuário.
Se isso fosse verdade, Jeremias então pode ter considerado aquele um lugar adequado para esconder os tesouros do Templo de Jerusalém. Havia uma série de possibilidades. Como sua religião parecia ter sido muito semelhante ao Judaísmo, podem ter existido edomeus simpatizantes com o empenho dos judeus que tomaram posse da Arca e a guardaram nessa caverna.
Uma outra alternativa, a caverna podia ter sido há muito tempo coberta por entulhos no início do século VI, e sua existência poderia ter sido esquecida por todos, menos por Jeremias e alguns poucos sacerdotes importantes. Sendo assim, Jeremias pode ter voltado ao local e escondido os tesouros, de forma secreta, conforme afirma o livro de Macabeus. Entretanto, tudo isso não passava de especulações. Precisava voltar a Jerusalém e consultar o banco de dados da Biblioteca Nacional de Israel para ver se conseguiria descobrir mais coisas a respeito do suposto tesouro dos Cruzados.
Quando voltei à biblioteca, descobri que o próprio Johannes Burckhardt descreveu a descoberta dos Cruzados como incluindo “tesouros de ouro puro, pedras preciosas e um baú dourado”. O baú poderia ser a Arca da Aliança, e as pedras preciosas poderiam ser as Pedras de Fogo que diziam sempre ser mantidas dentro dela. Da mesma forma, poderiam ser nada mais que qualquer baú e quaisquer outras jóias roubadas.
Infelizmente, Jack estava certo a respeito de não haver antigas referências acerca da lenda, e portanto, não havia como saber o que os Cruzados de fato encontraram, se é que haviam encontrado alguma coisa. No entanto, consegui descobrir quem eram os tais Cruzados que tinham estado no Vale de Edom durante o período em questão. No fim do primeiro milênio d.C, todo o Oriente Médio vivia sob a influência dos muçulmanos. Como essa região incluía as terras da Bíblia, ou a Terra Santa, como os cristãos a chamavam, os europeus sentiam que era sua obrigação conquistar a área e trazê-la para o domínio católico de Roma.
As guerras que se seguiram foram conhecidas como as Cruzadas e os guerreiros que lutaram a favor dos caristãos eram os Cruzadores. No século XII, os Cruzadores de países europeus como a França, Alemanha e Inglaterra, conquistaram Jerusalém e estabeleceram um reino cristão no lugar hoje chamado de Israel. Com o intuito de proteger os interesses dos cristãos na região, várias milícias religiosas foram formadas, e uma delas, os Cavaleiros Templários — ou apenas, Templários — ocuparam por algum tempo as ruínas da cidade de Petra por volta de 1180 para proteger as importantes rotas de comércio que passavam pelas Montanhas de Shara.
Como esses Templários tinham sido os únicos Cruzadores a ocupar o Vale de Edom, deve ter sido esse grupo o responsável pela descoberta. Naquela época, seu comandante era um cavaleiro inglês chamado Ralph de Sudeley, e por isso, provavelmente, os registros históricos a respeito de sua vida pudessem revelar outros dados com relação ao suposto tesouro. Não havia mais nada a respeito dele no banco de dados da Biblioteca Nacional, por isso, tudo parecia indicar que esses registros só poderiam ser encontrados na Inglaterra.
Como esse era o lugar onde, por acaso, eu morava, e precisava retornar para resolver outros negócios, decidi que continuaria pesquisando com base na pista de Sudeley assim que voltasse para casa. Eu, sinceramente, não esperava chegar em lugar algum. Entretanto, estava prestes a viver uma grande surpresa.
O que exatamente se sabia a respeito da antiga terra de Edom? Não somente a Bíblia, como também textos de países do Oriente Médio, além de Judá, referiam-se a ela. Ao examinar esses diversos relatos, a área descrita como Edom correspondia, grosso modo, à metade sul do Deserto de Negev, que em tempos bíblicos formava as partes habitadas ao sul e ao leste do Deserto de Sinai.
Ela, hoje, continua da mesma forma que no passado. Até onde os olhos alcançam, o sol bate impiedoso sobre rochas maciças e abrasadoras, em uma terra sem vida. Dia após dia, anos após ano, o solo arde sob o calor estonteante (n.T. uma grande diferença hoje é a existência da usina Nuclear de Dimona, onde Israel produziu e armazena cerca de 300 bombas atômicas).
Nesse deserto seco e rochoso, com 200 quilômetros de comprimento e 200 quilômetros de largura, as temperaturas podem chegar a mais de quarenta graus na sombra. À noite, porém, a temperatura mergulha chegando a congelar o ar, e um frio cortante desce sobre o campo estéril. As Montanhas de Shara passam bem ao meio dessa devastação árida, e bem no meio delas, está o vale que outrora fora chamado de Vale de Edom. Alimentado por correntezas de montanhas frias e ladeado por altos penhascos, o lugar era um porto para a vida sofrida em terrenos mais hostis.
Hoje, embora o vale seja muito mais cheio de vida do que o deserto adjacente, não pode ser considerado um lugar fértil como há três mil anos, quando as pancadas de chuva eram mais constantes e inúmeros riachos alimentavam seu solo. Localizado cerca de vinte quilômetros dentro do que hoje é chamado de reino da Jordânia, o Vale de Edom tem aproximadamente oitocentos metros de largura por cinco quilômetros de comprimento. Embora toda a parte sul de Negev fosse conhecida como a terra de Edom, na época dos antigos israelitas, o reino dos edomeus era um domínio muito pequeno, centralizado sobre esse vale fértil.
Parece, então, que esse vale isolado era a terra da qual Moisés teve de pedir permissão para o rei de Edom deixá-los cruzar após criar a fonte milagrosa de água. Como o incidente acontecera em Horebe, e Horebe era um outro nome do Monte Sinai, tudo indica que uma das montanhas que circundavam o Vale de Edom era a misteriosa Montanha de Deus. Nos tempos antigos, uma importante rota de comércio passava bem ao meio do Vale de Edom, de leste a oeste. A rota ligava o Egito à África com o mundo árabe e o Oriente, e os edomeus que a controlaram por mais e mil anos até o século IV, prosperavam com as tarifas que cobravam.
O vale era uma fortaleza natural com trechos facilmente protegidos, e as entradas para a rota de comércio eram desfiladeiros tão estreitos em alguns lugares, que animais de transporte só podiam passar em fila indiana. De acordo com o relato do Êxodo, o incidente da fonte milagrosa aconteceu na “rocha em Horebe” (Ex 17:5-6), e do relato dos Números podemos deduzir que o mesmo incidente aconteceu em um lugar chamado Kadesh (Cades) — o lugar sagrado — na fronteira do reino dos edomeus (Nm 20:9-17). Se os israelitas tinham vindo do sul do Deserto de Sinai, teriam chegado, então, na fronteira do reino dos edomeus em um desfiladeiro que é hoje conhecido como Siq al Barid, que em árabe quer dizer “canal frio” e chamado apenas de Siq como abreviação. Se minha teoria estivesse certa, era ali que o Monte Sinai seria encontrado.
Ao viajar para o sul de Jerusalém de ônibus, cruzei a fronteira de Israel até a Jordânia para chegar logo em seguida na cidade de Elji, que fica na extremidade externa do desfiladeiro de Siq. Elji não era nada parecido com o que eu esperava. Havia imaginado um calmo e pequeno vilarejo, habitado por apenas alguns poucos fazendeiros locais e suas famílias. No entanto, o lugar era um espaço popular entre os turistas com hotéis e lojas modernas de presentes e lembranças.
Depois de me instalar em um dos hotéis, olhei pela janela do quarto em direção às montanhas que se erguiam dos dois lados da entrada do desfiladeiro. Em contraste absoluto com o deserto, suas rochas eram uma paisagem de cores: marrom dourado, amarelo, laranja e vermelho. Se estivesse certo, uma dessas duas montanhas tinha de ter sido Horebe, onde Moisés criara a fonte milagrosa. Qual das duas, eu imaginava, teria sido o verdadeiro Monte Sinai, a Montanha de Deus?
No dia seguinte, contratei um guia local chamado Abdul, que quase imediatamente disse algo que me deixou impressionado. O Vale de Edom é hoje chamado de Wadi Musa, que em árabe quer dizer “o vale de Moisés”. Era assim chamado, Abdul me disse, porque existia uma tradição dos beduínos locais de que tinha sido ali que Moisés criara a fonte milagrosa na história do Antigo Testamento. Eu achava que tinha sido muito esperto ao descobrir que o povo local acreditava nisso há anos. Na verdade, chegaram a construir um santuário no lugar exato onde acreditavam que o incidente tinha ocorrido, próximo à entrada do Siq. Chamada de Ain Musa — a Fonte de Moisés —, ela era uma pequena mesquita com uma cúpula erguida sobre um tanque retangular, ainda alimentado por uma fonte de água fresca.
A tradição de Ain Musa era de fato antiga, como descobri posteriormente. Ela é confirmada pelo cronista árabe medieval Numairi. Numairi era um egípcio e sua crônica, datada do século XIII, ainda sobrevive na Biblioteca Nacional do Egito, no Cairo. Ao mencionar a aproximação de Petra, Numairi escreveu: No pé da montanha há uma fonte, que dizem jamais secar. As pessoas da região dizem que Moisés, o Profeta de Deus, que descanse em paz, a gerou com sua vara.
O deserto do Sinai
Se essa fonte fosse de fato a citada no relato do Êxodo — uma fonte surgiu em uma rocha “em Horebe” — ao que tudo indica, a montanha erguida acima dela nada mais era que o próprio Monte Horebe. Do lado de fora do santuário, avistei os altos penhascos de arenito que se erguiam diante de mim. Seria essa, de fato, a Montanha de Deus? Perguntei a Abdul se existiam quaisquer tradições que associavam a montanha ao Monte Sinai. Infelizmente, ele não conhecia nada a esse respeito. Entretanto, ele me disse que há muito tempo, ela fora considerada um lugar sagrado pelos beduínos da região. Era chamada de Jebel Madhbah — Montanha do Altar — porque havia um antigo santuário em seu pico, que tinha mais de três mil anos de idade.
O que me impressionou ainda mais, por tudo o que já sabia, era que nenhum estudioso bíblico, arqueólogo ou historiador que tentara buscar a Montanha de Deus parecia admitir a relevância do santuário de Ain Musa. Só podia supor que não haviam relacionado o relato do livro dos Números da criação da fonte milagrosa de Moisés, ao mesmo relato no livro do Êxodo. Abdul se ofereceu para me levar até Jebel Madhbah e me mostrar o santuário no cume da montanha. A única forma de chegar lá era por dentro da Wadi Musa, e o meio mais rápido para subir ao local seria à cavalo ou com um camelo.
Abdul tinha diversos cavalos à sua disposição, mas eu só havia cavalgado uma única vez na vida e duvidava que fosse capaz de subir com o animal, e muito menos controlá-lo. No entanto, não foi tão difícil quanto imaginei; o animal parecia saber o que fazer e simplesmente seguiu o cavalo de Abdul e parou ao mesmo tempo que ele. Assim como para os antigos israelitas, o único caminho para entrar no Vale de Edom pela extremidade sul, evitando a rebocadura íngreme das montanhas, era através do Siq, que se estendia ao leste por quase dois quilômetros de rochas sólidas.
Essa rachadura profunda e estreita foi criada há milhões de anos quando alguma sublevação geológica gigantesca literalmente partiu a montanha em duas. No início, esse desfiladeiro longo e espiralado tinha cerca de quatro metros e meio de largura, mas quanto mais caminhávamos por ele, mais estreito ele ficava, até que a luz do sol não mais brilhava por entre as paredes escarpadas dos dois lados. Aparentemente, é por isso que era chamado de “canal frio”. Finalmente, após cavalgarmos pelo que parecia uma eternidade, e exatamente quando o corredor profundo e escuro parecia fechar-se por completo diante de nós, alcançamos uma das vistas mais espetaculares que já vi.
A entrada do SIQ, um estreito desfiladeiro que leva até a antiga cidade de Petra, totalmente escavada na rocha.
Erguendo-se acima de nós no penhasco à frente havia uma edificação com 40 metros de um monumento gigantesco: duas fileiras de colunas altíssimas, frontões triangulares colossais, vãos para estátuas e cântaros esculpidos, todos cravados na curvatura da face da rocha. Era, disseram-me, a entrada para uma série de amplas câmaras que adentravam a montanha. Imediatamente, percebi que já tinha visto aquele monumento antes. Fora usado por Steven Spielberg como o repositório perdido do Santo Graal em seu filme Indiana Jones e a Última Cruzada. Hoje chamado de Al Khazneh — o Cofre — sua função original é um mistério, mas acredita-se tratar-se dos restos de uma tumba de dois mil anos de idade.
Por mais antigo que possa ser, o Cofre não estivera ali quando os edomeus ocuparam o Vale nos tempos do Antigo Testamento. Abdul explicou que aquele era um dos muitos monumentos construídos pelos nabateus que se mudaram para o Vale de Edom no século IV a.C. Forçados a ir para o oeste pelo crescente império babilônico, os nabateus surgiram ao redor do Golfo Árabe e foram inicialmente compelidos a levar uma existência nômade no Deserto da Arábia. Alguma coisa, talvez incursões dos babilônios, enfraqueceram os edomeus entre os séculos VI e IV a.C. o que fez com que os nabateus se mudassem para o Vale de Edom e ganhassem o controle do local.
No fim do século IV a.C, Alexandre, o Grande estabelecera a influência dos gregos por todo o leste do Mediterrâneo, e os nabateus logo passaram a controlar as novas rotas de comércio que surgiram nas Montanhas de Shara. Edificado em um cruzamento entre as terras do Mediterrâneo e as terras do Leste Próximo e da Ásia, o reino dos nabateus tornou-se rico e poderoso, e uma grande cidade, a cidade de Petra, desenvolveu-se no coração do vale. Uma das cidades mais importantes do Oriente Médio, Petra permaneceu independente até que foi incorporada pelos romanos, em 106 d.C.
Em Petra, na Jordânia, a enorme entrada do Al Khazneh (tradução árabe para “O Cofre/Tesouro”) é um dos maiores monumentos de Petra. A data da construção desse monumento é desconhecida, sendo atribuído, porém, a algo entre 200 a.C.e 100 D.C.
Abdul queria me mostrar todo o Cofre, por isso descemos de nossos cavalos e entramos no local. No interior escuro, passando por uma enorme entrada com uns seis metros de altura, deparei-me com um amplo corredor que dava acesso a salas vazias e frias, bem ao fundo da montanha. Enquanto acompanhava meu guia de uma câmara a outra, ele me contou que os arqueólogos acreditavam que ali havia sido a tumba de um importante rei nabateu que vivera em Petra nos tempos romanos. Quando perguntei o porquê de o lugar se chamar o Cofre, Abdul contou-me uma história fascinante de um tesouro escondido.
Ao que parece, no século XII, alguns Cavaleiros Cruzados europeus tinham encontrado jóias e artefatos de ouro puro escondidos em uma caverna da redondeza. Desde então, inúmeros caçadores de tesouros escavaram por todos os arredores do monumento, na esperança de encontrar mais peças. Quando saíamos do Cofre, dois grupos de turistas ocidentais chegaram no local. Ao ouvir vozes de pessoas falando em inglês, estava prestes a ir até eles para bater papo quando algo muito estranho aconteceu.
Uma rajada de vento repentino e violento chicoteou a poeira do chão do vale, fazendo com que os cavalos começassem a relinchar, forçando os turistas a cobrir seus rostos enquanto uma areia quente e seca soprava na direção de meus olhos. Foi então que ouvi o som mais assustador da minha vida. Era um barulho ensurdecedor, como uma cacofonia bizarra de trombetas de orações budistas sendo sopradas em uníssono.
Incapaz de ver, tentei imaginar o que estaria acontecendo. Alguns segundos depois, o vento se acalmou e o ruído parou. Quando, finalmente, consegui abrir meus olhos, pude ver que os turistas estavam tão assombrados quanto eu. Olhavam ao seu redor em um silêncio perplexo, enquanto dois guias árabes riam enlouquecidos. Atrás de mim, Abdul se juntou a eles. “Isso sempre assusta os visitantes,” ele riu. Explicou que o som estranho era um fenômeno raro, porém natural, criado por um vento forte que às vezes uiva pelo Siq. Os beduínos locais, ele me disse, chamam-no de “a trombeta de Deus”.
A princípio, ri junto com eles. Os guias obviamente ainda não tinham dito aos turistas, que ainda estavam visivelmente abalados pelo som sobrenatural como a causa do barulho. De repente, porém, aquela cena me fez lembrar de algo que tinha, naquela mesma manhã, lido na Bíblia. Estivera relendo os versículos mais relevantes do Antigo Testamento que mencionava a primeira visita dos israelitas na Montanha de Deus. De acordo com Êxodo 9:11-27, enquanto Moisés preparava os israelitas para testemunhar a manifestação de Deus, eles acamparam ao pé da montanha.
No terceiro dia, Deus finalmente desceu sobre o Monte Sinai: Houve trovões e relâmpagos sobre o monte, e uma espessa nuvem, e um sonido de buzina mui forte, de maneira que estremeceu todo o povo que estava no arraial. (Ex 19:16) Uma buzina mui forte! Podia essa ser uma antiga descrição do mesmo som que acabara de ouvir? Se os israelitas acamparam ao pé de Jebel Madhbah, eles podiam muito bem ter montado seu acampamento exatamente sobre o mesmo lugar onde eu estava naquele instante.
A enorme fenda, conhecida como SIQ, e o desfiladeiro montanha acima.
A passagem do Êxodo sugeria que uma tempestade violenta estava se formando — e com as tempestades vêm os ventos. (Hoje, essas tempestades são uma raridade na região, embora quando caem, as chuvas podem ser torrenciais.) Se o vento tivesse uivado pelo desfiladeiro como acabara de acontecer, os antigos israelitas podem muito bem ter ficado aterrorizados como os desnorteados turistas. Os israelitas consideraram o som que ouviram como um sinal de Deus. Os beduínos locais chegaram a chamar o fenômeno de a trombeta de Deus. Uma coincidência, talvez, mas algo, sem dúvida alguma, fascinante!
Enquanto continuávamos nossa viagem pelo vale, olhei para o alto contemplando Jebel Madhbah, toda aquela imensidão que se erguia acima do Cofre. Será que os antigos israelitas, de fato, viram algo espetacular em algum lugar entre aquelas rochas primitivas e desgastadas pelo tempo — uma manifestação tão surpreendente que, para eles, não poderia ter sido outra coisa, senão do próprio Deus? Além do Cofre, havia um outro desfiladeiro, conhecido como o Siq Externo, flanqueado em suas duas laterais por uma parede de penhascos escarpados. Entretanto, não era nem um pouco estreita quanto o próprio Siq, com cerca de sessenta metros de largura.
O caminho nos levou até Wadi Musa, a aproximadamente quinhentos metros ao norte, onde uma planície larga e horizontal se dispunha entre montanhas escabrosas, que se estendiam diante de nós. Na época de Moisés, aquele lugar fora o lar dos edomeus, mas as ruínas que hoje dominam o vale, são os restos da cidade de Petra dos nabateus. São, na verdade, ruínas clássicas, que tiveram suas construções influenciadas pelas arquiteturas gregas e romanas — um anfiteatro, as paredes das casas, prédios administrativos e templos, todos dispostos ao redor de uma série de estradas pavimentadas.
Dos dois lados dessas avenidas retas, pilares de pedras, colunatas e estátuas quebradas marcam os caminhos que, há muito tempo, compunham as vias da antiga cidade. Cravados nos penhascos ao redor de Petra existem centenas de tumbas ornadas e dispersas, muitas delas parecidas com o Cofre, embora não tão grandes. Antes dos nabateus mudarem-se para o vale, a capital dos edomeus ficava nesse local. Pode ter sido menos elaborada, mas era uma cidade sofisticada para a época. Nas escavações de assentamentos dos edomeus foram encontrados cerâmicas decoradas, tábuas de argila com inscrições e muitos outros artefatos de trabalhos manuais de alto padrão, revelando uma população próspera e bem defendida.
Embora essa tenha sido uma colonização com casas simples de tijolos de barro, havia um complexo do palácio central de onde os líderes dos edomeus controlavam o reino de seu vale. O mais antigo nível de ocupação foi descoberto como datado de cerca de 1500 a.C, o que mostrou a existência da presença dos edomeus no vale quando os israelitas podem ter chegado ali, por volta de 1360 a.C. “Os antigos edomeus tinham uma cultura avançada”, Abdul me disse enquanto descíamos de nossos cavalos com um dos funcionários do anfiteatro de estilo romano olhando-nos da entrada do Siq Externo.
As tumbas na região de Petra.
“O santuário no cume de Jebel Madhbah foi construído por eles, e para conseguirem chegar até ele, fizeram isso”. Ele apontou para um lance de degraus desenhado na lateral do penhasco que subia em forma de ziguezague pelo lado da montanha. Abdul estava muito mais em forma do que eu, e depois de termos escalado mais de trinta metros acima do vale, eu estava exausto. Finalmente, chegamos em um platô de pedras, com cerca de sessenta metros de comprimento por trinta metros de largura. Era conhecido como o Terraço dos Obeliscos, Abdul me explicou, por causa de dois enormes monumentos que havia ali. Sobre o terraço, com uma distância de trinta metros entre elas, havia dois obeliscos altos: enormes pilares de rocha sólida, cada um deles com cerca de seis metros de altura.
Após recompor minha respiração e examinar os monumentos, logo percebi que o trabalho necessário para criar aquelas estruturas gigantescas era algo ainda mais impressionante do que podia imaginar. Elas foram esculpidas a partir do alicerce da montanha. Para dar forma àqueles obeliscos, os construtores tiveram que extrair rochas sólidas de seus arredores, Abdul explicou. Todo o terraço, com 6.000 metros quadrados ao todo, era uma construção artificial — uma realização surpreendente para um povo sem tecnologia moderna.
Mais incrível ainda, não fora a civilização dos nabateus que a criara, mas sim os primeiros edomeus. Escavações das pedras encontradas ao redor do platô revelaram restos orgânicos — como por exemplo, ossos de animais — que tinham sido datados por meio de testes de radiocarbono de cerca de 1500 a.C. Notavelmente, portanto, esses monumentos já estariam ali quando os israelitas parecem ter deixado o Egito para vagar pelo Deserto de Sinai, por volta de 1360 a.C.
O local deve ter sido ainda mais impressionante quando foi criado. Arqueólogos encontraram grandes placas quebradas de ardósia trabalhada na mestra do reboco ao redor do platô e concluíram que as pedras, que não eram naturais da região, haviam sido usadas para formar um área pavimentada ao redor dos obeliscos. Após examinar os fragmentos da ardósia em detalhes, os arqueólogos calcularam que haviam sido polidas para criar uma superfície azulada brilhante para a afluência de pessoas onde, ao que parece, cerimônias religiosas aconteciam.
“Esses obeliscos parecem ter sido a entrada processional do santuário que fica ali no pico”, disse Abdul, indicando o topo da montanha, que era ligado ao terraço por um sulco estreito com cerca de cento e oitenta metros de comprimento. “Os beduínos ainda consideram esse platô como um solo sagrado; chamam esses monumentos de Al-Serif, que significa ‘os pés’, porque têm uma tradição de que Deus esteve aqui presente.”
Eu esperava encontrar lendas locais que estabelecessem uma conexão entre Jebel Madhbah e o aparecimento bíblico de Deus, e agora tinha uma. Além disso, a topografia da montanha era equivalente às descrições da Montanha de Deus no Antigo Testamento. O nível do rompimento do terreno de Jebel Madhbah — o terraço dos obeliscos abaixo do santuário no pico da montanha — certamente se encaixava com o que sabemos a respeito do primeiro encontro dos israelitas com Deus no Monte Sinai.
O Terraço de Obeliscos
Após ter criado a fonte milagrosa, e os israelitas montarem seu acampamento no pé da montanha, Moisés preparou seu povo para se encontrar com o próprio Deus: O Senhor descerá diante dos olhos de todo o povo sobre o monte Sinai… E Moisés levou o povo fora do arraial ao encontro de Deus; e puseram-se ao pé do monte. (Ex 19:11, 17)
Está implícito aqui que havia dois níveis para o lugar sagrado onde Deus seria encontrado. Como o “pé” do monte significa um nível “inferior,” as pessoas estavam em algum lugar abaixo do precinto do topo da montanha santa onde Moisés mais tarde recebeu os Dez Mandamentos — exatamente como teria acontecido se os israelitas tivessem subido em Jebel Madhbah, no lugar do Terraço dos Obeliscos, e olhassem em direção ao cume do monte, a cento e oitenta metros ao norte. Em uma outra ocasião, os anciãos israelitas foram mais uma vez convidados a subir até a parte inferior da montanha:
Depois (Deus) disse a Moisés: Sobe ao Senhor, tu e Aarão, Nadabe e Abiú, e setenta dos anciãos de Israel; e adorai de longe. E só Moisés se chegará ao Senhor: mas eles não se cheguem; nem o povo suba com ele… E subiram Moisés e Aarão, Nadabe e Abiú, e setenta dos anciãos de Israel: E viram o Deus de Israel: e debaixo de seus pés havia como que uma pavimentação de pedra de safira. (Ex 24:1-10) Surpreendentemente, essa passagem poderia ser uma descrição exata do Terraço dos Obeliscos. A pedra azul polida que os arqueólogos encontraram pode muito bem ter feito com que o terraço brilhasse com o reflexo da luz do sol “como que uma pavimentação de pedra de safira”.
Os pés de Deus são inclusive mencionados, estabelecendo uma ligação com a antiga tradição da escritura dos beduínos. A lenda pode muito bem ter surgido de uma antiga associação entre o relato bíblico e o Terraço dos Obeliscos. Por diversas vezes, o Antigo Testamento se refere aos marcos sagrados como os anexos de Deus. Por exemplo, a colina sobre a qual a cidade de Samaria se erguia era chamada de o “Punho de Deus”, e havia também Penuel, a “face de Deus” — um penhasco no vale da Jordânia. Quando Abdul finalmente me conduziu pela passagem que levava ao santuário no pico da montanha, vi-me diante de uma outra estrutura de antiga engenharia bastante impressionante.
Conhecido como o Lugar Superior, aquele era um antigo templo ao ar livre, com mais de novecentos metros acima do nível do mar. Como os obeliscos, a estrutura fora alicerçada nas rochas sólidas do monte e acredita-se ser datada do mesmo período. Uma grande depressão retangular, medindo cerca de quinze por seis metros, fora cortada com perfeição a partir do arenito a uma profundidade de aproximadamente quinze polegadas, e ao seu redor estavam os restos dos bancos de pedras lapidadas onde os adoradores se sentavam. Próximo ao centro deste pátio, como os arqueólogos se referem a este espaço, havia uma plataforma de pedras, de dois por um metro, erguida ao lado de uma enorme bacia de pedra quase do mesmo tamanho. O altar principal tinha degraus escarpados e era provavelmente de onde os sacerdotes edomeus presidiam seus rituais, enquanto que a bacia, ao que tudo indica, era usada para depositar o sangue dos animais sacrificados.
Se Jebel Madhbah era o Monte Sinai, esse templo ao céu aberto é onde Moisés teria vindo sozinho para receber os Dez Mandamentos: Então disse o Senhor a Moisés, Sobe a mim ao monte, e fica lá; e dar-te-ei as tabelas (tábuas) de pedra, e a lei, e os mandamentos que tenho escrito para vos ensinar. (Ex 24:12) Se esse santuário de fato datava do mesmo período do Terraço dos Obeliscos, como os arqueólogos acreditavam, então, seria ali que, no tempo de Moisés, a história teria acontecido. E se o historiador judeu Josephus estivesse certo, o povo da região ao redor do Monte Sinai já o considerava uma montanha santa antes de Moisés ou dos israelitas ali chegarem.
Josephus nos diz que, quando Moisés pisou pela primeira vez na montanha, o povo local não permitia a pastagem em suas ladeiras porque os “homens de opinião diziam que Deus habitava ali”. Se a montanha já era considerada sagrada, imaginamos que já existia ali algum tipo de templo, e o Lugar Superior no pico de Jebel Madhbah, pode muito bem ter sido esse santuário.
Os edomeus eram parentes próximos dos israelitas, e portanto sua religião pode ter sido bastante semelhante. Independentemente de qual divindade os edomeus adoravam em Jebel Madhbah, porém, se este era o Monte Sinai, o santuário pode ter sido o lugar onde acreditava-se que Deus aparecera para Moisés: E, subindo Moisés ao monte, a nuvem cobriu o monte. E a glória do Senhor repousou sobre o monte Sinai, e a nuvem o cobriu por seis dias; e ao sétimo dia chamou a Moisés do meio da nuvem. E o parecer da glória do Senhor era como um fogo consumidor no cume do monte, aos olhos dos filhos de Israel. (Ex 24:15-17)
Quando perguntei a Abdul se ele conhecia alguma lenda que dissesse respeito ao santuário, ele me disse algo que podia muito bem explicar o que os israelitas tinham de fato visto. Abdul não conhecia nenhuma lenda específica, mas tinha informações acerca de um fenômeno interessante — uma estranha luz que diziam ter visto no pico de Jebel Madhbah. A última vez que fora relatada foi em 1993. Uma equipe de arqueólogos ingleses estava trabalhando ao redor do santuário, quando foram pegos por um temporal com trovões nada comum.
De acordo com o testemunho de mais de uma dúzia de pessoas, os arqueólogos corriam tentando escapar da ameaça de serem atingidos por raios que caíam sobre a montanha, quando viram uma bola de luz vermelha que parecia fogo, que estimaram ter um metro e meio de diâmetro, e que pairava a alguns metros no ar sobre as ruínas do templo. Ficou visível por cerca de cinco minutos, movimentando-se calmamente para frente e para trás antes de desaparecer. Abdul me garantiu que sabia de muitas pessoas que haviam testemunhado o espetáculo, e mais tarde cheguei a falar com mais de seis residentes idosos de Elji que juravam ter visto a bola.
Esse estranho fenômeno podia muito bem ser descrito “como um fogo devorador” — a glória do Senhor que os israelitas dizem ter visto — mas o que seria aquilo? A primeira possibilidade era de que se tratava de algo conhecido como o relâmpago da esfera: bolas de partículas altamente carregadas criadas pela atmosfera eletrificada de um temporal com raios. O relâmpago da esfera acontece com maior freqüência em lugares elevados, como por exemplo picos de montanhas, topos de arranha-céus e ao redor de mastros de rádios.
No entanto, a cor, tamanho e longevidade do espetáculo não pareciam se encaixar na descrição do relâmpago da esfera. Esse relâmpago tem coloração azulada, não sendo maior que uma bola de futebol, e somente permanece visível por alguns segundos. As testemunhas do fenômeno de Jebel Madhbah descreveram-no como tendo uma cor vermelha ou amarela, muito maior de tamanho e visível por cerca de cinco minutos. Há, no entanto, um outro fenômeno natural que parecia mais coerente com o que fora relatado — uma rara anomalia eletromagnética conhecida como geoplasma.
O plasma é um gás eletricamente carregado que tem propriedades peculiares. Em um gás comum, cada átomo contém um número igual de cargas positivas e negativas, e as cargas positivas no núcleo são cercadas por um número igual de elétrons negativamente carregados. Se uma fonte de energia externa faz com que os átomos de um gás liberem elétrons, os átomos são deixados com uma carga positiva e dizem que o gás fica ionizado. Quando átomos suficientes são ionizados, o gás incendeia-se com uma “chama fria” que carrega uma forte carga estática. Isso é conhecido como plasma. Por ser tão leve quanto o ar ao seu redor, o plasma pode pairar ou ficar pendurado no ar como uma esfera ou uma coluna de gás luminoso, que pode se movimentar ou ficar parada, dependendo das condições, e pode continuar nesse estado por vários minutos.
Acredita-se que o geoplasma é um fenômeno causado por geodinâmica — em linguagem simplificada, certos tipos de rocha ao serem esfregadas uma contra a outra por meio de uma atividade sísmica para ionizar o ar acima delas. Por causa da raridade e irregularidade do geoplasma, pesquisas científicas a seu respeito só foram conduzidas de forma adequada nas últimas duas décadas. Em 1981, Brian Brady, o então ministro de Minas e Energia dos Estados Unidos, foi o primeiro a produzir o que parecia ser geoplasma miniatura em um laboratório. Quando o centro de um granito cornalina era comprimido em condições escurecidas, pequeninas faíscas de luzes vermelhas e amarelas eram vistas esvoaçando-se ao redor da câmara do moedor das rochas.
Estranhas luzes, como essas descritas em Jebel Madhbah, foram relatadas em vários locais em todo o mundo, geralmente em regiões com tendências a terremotos e tremores, e em áreas com tipos específicos de rochas que contém grandes quantidades de óxido de ferro e quartzo, como por exemplo, o arenito e o granito cornalina. Embora terremotos sejam algo raro ao redor de Jebel Madhbah, a montanha apresenta pequenos tremores, e o pico é composto de arenito. Quando mais tarde li relatórios dessas anomalias e a pesquisa acerca do geoplasma, não pude deixar de imaginar se esses fenômenos eram a causa de Jebel Madhbah ter sido considerada sagrada.
Se os antigos edomeus tinham testemunhado esse fenômeno, eles, sem dúvida, os teriam considerado sobrenaturais em sua origem. Esse pode ter sido o motivo, se Josephus estivesse se referindo à mesma montanha, de os homens acreditarem que era ali que Deus habitava. Isso poderia perfeitamente explicar por que o santuário e o Terraço dos Obeliscos foram construídos. Nos anos 90, alguns geólogos propuseram que fatores além do tipo de rocha e da atividade sísmica eram necessários para produzir o geoplasma em um ambiente natural.
O geólogo norueguês Erling Strang considerava que variações locais no campo magnético da Terra eram um fator contribuinte, e John Derr, do Instituto Geológico Americano, sugeriu que a água era um elemento essencial na produção de geoplasma na paisagem. O calor produzido por movimento tectônico, ele afirmou, cria um revestimento de vapor que cobre as margens de uma fenda geológica e serve para isolar o desenvolvimento de uma carga eletromagnética. A maior parte dos fenômenos geoplasmáticos são de fato relatados durante ou após chuvas fortes. O evento testemunhado pelos arqueólogos em Jebel Madhbah em 1993 é um desses casos.
Chuvas fortes também acompanharam a aparição da “glória do Senhor”, conforme testemunhado pelos antigos israelitas. Êxodo 19:16 nos conta que havia “trovões e relâmpagos, e uma nuvem espessa sobre o monte.” Na verdade, a comparação do Êxodos da “glória do Senhor” com o “fogo devorador” é uma excelente descrição de um fenômeno geoplasmático. Eu estava agora convencido de que Jebel Madhbah era a Montanha de Deus citada na Bíblia. As passagens do Antigo Testamento indicavam que a montanha ficava na terra de Edom, especificamente na fronteira do reino de Edom onde Moisés criou a fonte milagrosa.
Os beduínos locais há muito tempo acreditavam que o santuário próximo à entrada para o Siq, ao pé de Jebel Madhbah, era o local da fonte milagrosa. Os dois níveis da montanha se encaixavam com a descrição física do Monte Sinai, e aquele era considerado um lugar sagrado quando os israelitas chegaram. Havia ainda dois estranhos fenômenos naturais que podiam explicar as descrições no relato do Antigo Testamento da aparição de Deus no monte santo — em outras palavras, o bizarro som de trombetas no Siq e as peculiares luzes relatadas no cume da montanha. Se essa era, de fato, a verdadeira Montanha de Deus, era aqui que diziam que o profeta Jeremias havia escondido a Arca.
Mas Jebel Madhbah era uma montanha enorme. Seria eu capaz de encontrar a caverna que o livro de Macabeus dizia ser o lugar onde Jeremias escondera a Arca? Precisava, antes, resolver um dilema crucial. Por que os antigos israelitas consideravam a montanha dos edomeus como o lugar da habitação de seu próprio Deus?
O Santuário da Bíblia fica próximo à Biblioteca Nacional e ao Museu de Israel, ao sudoeste de Jerusalém. Paradoxalmente, embora tenha sido construído com a intenção de guardar uma das coleções de manuscritos mais antigas do mundo, a arquitetura do Santuário é um tanto futurista demais.
A galeria principal é mais parecida com o interior de um disco voador do que com uma biblioteca — uma enorme sala redonda sem janelas coberta por uma grande redoma em forma de anel e banhada por uma iluminação alaranjada que parece irradiar das próprias paredes.
No centro da sala estão os mais preciosos pergaminhos, mantidos dentro de um círculo de painéis iluminados que parece o sistema de controle de uma nave extraterrestre. Ao falar com um dos superintendentes do Santuário, logo descobri que o Dr. Griver era um dos únicos a achar que os Essênios tinham possuído a Arca da Aliança. Na verdade, a maioria das pessoas que trabalham no local com quem conversei no Santuário da Bíblia, considerava o pergaminho traduzido pelo Dr. Griver como uma parábola religiosa, e não um transcrito de acontecimentos reais. Contudo, me disseram que ele, de fato, citava a Arca da Aliança e as Pedras de Fogo, e que, com certeza, mencionava a crença dos Essênios de que eram os sucessores espirituais dos arcanjos Miguel e Gabriel. Na realidade, a comunidade de Qumran chegou a se auto denominar os Filhos da Luz — a referência à luz como uma alusão aos anjos.
Entretanto, em nenhum lugar, garantiram-me, o texto afirmava que os Essênios tinham estado de posse da Arca ou das Pedras de Fogo. Naturalmente, o Dr. Griver ainda podia estar certo: O fato de que os Essênios se consideravam os sucessores dos arcanjos, pode muito bem implicar que eles eram os guardiães dessas relíquias sagradas. Todavia, parecia não haver provas de que realmente o foram. Independentemente do que os Essênios afirmavam ou não possuir, a teoria do Dr. Griver se baseava no fato de que a Arca ainda estava no Templo de Jerusalém pouco antes de os gregos o saquearem, em 167 a.C. Ele acreditava que os Essênios, uma facção dos sacerdotes do Templo, foram incumbidos de guardar e proteger a Arca quando houve um caso de perigo iminente causado pelo rei Antiochus IV.
Portanto, havia qualquer evidência de que a Arca ainda estivesse no Templo de Jerusalém no início do século II a.C? Para responder minha pergunta, o curador levou-me até o terminal de um computador em uma das salas de leitura do Santuário, onde acessou um arquivo que mostrava todas as fontes históricas que tratavam do ataque grego ao Templo. Ao examinar a listagem, ele me disse que o episódio aconteceu em um período do qual muitos outros textos históricos existem, se comparado ao início da história dos hebreus.
A rebelião que o incidente desatou é conhecida como a Revolta dos Macabeus, e é relatada com riqueza de detalhes em uma série de documentos e cartas que foram escritos pouco antes de ter acontecido. Bastante conhecida como a Pseudepigrapha, os documentos fazem repetidas referências ao Templo de Jerusalém e seus vasos sagrados. No entanto, como o curador me mostrou ao abrir outros arquivos com diversos textos, nenhuma vez sequer, eles se referiam à presença da Arca no Sagrado dos Sagrados (Sanctun Santorum) no período em que o Templo foi saqueado sob as ordens de Antiochus IV. Na verdade, o relato mais importante que sobreviveu a respeito da Revolta dos Macabeus é encontrado nas Antiguidades dos Judeus, escrita pelo historiador judeu Josephus. Embora Josephus tenha escrito dois séculos depois do acontecimento, ele teve acesso a muitos antigos trabalhos judeus que hoje não existem mais.
O curador abriu o arquivo que continha a passagem de Josephus na qual falava do ataque de Antiochus do Templo: Assim ele deixou o templo vazio, e levou os candelabros de ouro, e o altar de ouro, e a mesa (para o pão não fermentado), e o altar (para ofertas queimadas); e não se esqueceu nem ao menos dos véus, que eram feitos de escarlate e linho puro… e não deixou nada naquele lugar. O trabalho incluía, por ordem de nome, os tesouros mais sagrados do Templo que foram roubados, mas não mencionava a Arca. A Arca era o bem mais sagrado dos judeus. Se ela ainda estivesse no Templo quando a Revolta dos Macabeus aconteceu, o curador explicou, é quase certeza que os autores judeus da Pseudepigrapha, e em especial, o historiador judeu Josephus, a teriam mencionado.
Na verdade, ele me disse que não sabia de nenhuma referência histórica dos judeus de alguém que afirmasse possuir a Arca da Aliança após o ataque babilônico do Templo de Jerusalém em 597 a.C. Parecia que a Arca da Aliança teve de ser retirada do Templo mais de quatro séculos antes do ataque de Antiochus. Todas as evidências disponíveis apontavam para o fato de ela ter sido retirada no tempo da invasão dos babilônios e, por alguma razão, nunca ter sido devolvida. Eu, portanto, precisava consultar as referências históricas do ataque babilônico de Jerusalém.
Infelizmente, diferente do período da ocupação grega de Judá, poucas fontes históricas com relação a este acontecimento existem em outro lugar, que não no Antigo Testamento. Visto que o curador havia me deixado no computador para continuar minhas pesquisas sozinho, decidi procurar as passagens bíblicas de relevância. Duas passagens do Antigo Testamento, 2 Reis 25:13-15 e Jeremias 52:17-19, referem-se ao roubo dos babilônios de todos os artigos sagrados que estavam no Templo. Como ambos usam palavras quase idênticas e listam exatamente os mesmos itens na mesma ordem, qualquer um dos relatos foi tirado do outro, ou os autores usaram as mesmas fontes.
A maioria dos estudiosos bíblicos consideram o relato de Jeremias como o original, por ele ser atribuído a um escriba chamado Baruch, que dizem ter sido uma testemunha ocular dos eventos. Seu relato parece listar todos os recipientes que foram levados:
“Quebraram mais os caldeus as colunas de bronze, que estavam na casa do Senhor, e as bases, e o mar de bronze, (uma tigela ornamental grande) que estava na casa do Senhor, e levaram todo o bronze para Babilônia. Também tomaram os caldeirões, e as pás, e as espevitadeiras, e as bacias, e as colheres, e todos os utensílios de bronze, com que se ministrava. E tomou o capitão da guarda as bacias, e os braseiros, e as tigelas, e os caldeirões, e os castiçais, e as colheres, e os copos; tanto o que era de puro ouro, como o que era de prata maciça.”
Esta, e a lista idêntica no relato de Reis, parecia ser bastante completa, porém não mencionava a Arca. Eu já sabia que a Arca parecia ainda estar no Templo durante o reinado de Josias, cerca de vinte e cinco anos antes da invasão babilônica, conforme está escrito em 2 Crônicas 35:1-3. Se esses dois relatos estiverem certos — e parece não haver razão para duvidarmos deles, porque parecem ter sido escritos em um espaço de tempo no qual ainda podiam se lembrar dos eventos — a conclusão mais lógica era a de que a Arca da Aliança fora retirada do Templo em algum momento entre os anos 622 e 597 a.C. Mas, quem a teria levado e por quê?
Para conseguir uma resposta, recorri à última referência à Arca da Aliança no Antigo Testamento — no livro do profeta Jeremias. Aceitando as palavras como do próprio Jeremias, que foram escritas por seu escriba Baruch, 3:16, a passagem diz:
“A arca da aliança do Senhor, nem lhes virá ao coração; nem dela se lembrarão, nem a visitarão.”
Muitos estudiosos bíblicos deduzem, com base nesse versículo, que o profeta está avisando o povo judeu que a Arca será tirada deles se não mudarem seus costumes. Pessoalmente, não pude deixar de pensar se o versículo inferia que a Arca já havia sido levada. Jeremias foi a figura religiosa judaica mais proeminente desse tempo, e portanto, se alguém tinha a autoridade para levar a Arca do Templo, esse alguém era ele. Obviamente, eu tinha de descobrir mais a respeito de Jeremias.
De acordo com o Antigo Testamento, Jeremias era o profeta líder dos judeus no tempo da invasão babilônica. Tinha iniciado seu ministério trinta anos antes, durante o reinado de Josias, quando ele parece ter sido responsável por uma série de reformas religiosas significantes. Desde então, até o tempo da conquista, ele era a figura religiosa mais importante em Judá. Durante esse tempo, Judá vinha gozando de um período de sucesso e prosperidade, uma sorte que não conhecera por muitas gerações. Entretanto, prevendo um perigo futuro, Jeremias mantinha os judeus sob alerta para que se preparassem para enfrentar os babilônios, cujo império ao norte se expandia a cada ano. Poucas pessoas, porém, ouviram seu conselho.
Em 605 a.C, as predições de Jeremias começaram a se concretizar quando os babilônios invadiram o norte de Judá. O rei da Judéia, Jehoiakim, foi forçado a jurar lealdade à Babilônia, mas, em troca, Jerusalém e o sul de Judá foram deixados sob seu controle. Pelos oito anos seguintes, a vida em Jerusalém continuou normal e o Templo permaneceu em segurança. Entretanto, em 597 a.C, uma revolta aconteceu no exército babilônico e, contra os conselhos de Jeremias, Jehoiakim se aproveitou da oportunidade para tentar expulsar os invasores do norte de Judá. A breve campanha foi catastrófica para Jehoiakim, e quando o exército da Judéia foi derrotado, o rei babilônico Nabucodonosor, dominou Jerusalém e saqueou o Templo.
Parecia, então, que Jeremias não estava em posição de esconder a Arca, mas seus constantes alertas com relação ao perigo dos babilônios mostram que ele teve a presciência de fazê-lo. Passei algum tempo estudando o banco de dados do Santuário e algum tempo depois descobri que existia ali um antigo texto apócrifo que, na verdade, alegava que Jeremias tinha escondido alguns dos tesouros do Templo pouco antes da chegada dos babilônios. Aquele era um raro manuscrito grego do século I conhecido como O Paralipomena de Jeremias — “As ‘Palavras Póstumas’ de Jeremias”. Atribuído a um homem grego anônimo convertido ao Judaísmo, ele afirmava ser uma cópia de um antigo texto hebraico escrito por Baruch, que está descrito nesse texto como um servidor no Templo de Jerusalém, que trabalhava como um escriba pessoal de Jeremias.
De acordo com o manuscrito, assim que a invasão dos babilônios em Jerusalém tornou-se iminente, Deus falou com Jeremias e lhe alertou para que escondesse alguns itens sagrados do Templo: E Jeremias disse, Senhor, agora sabemos que estás entregando a cidade nas mãos de seus inimigos, e eles levarão o povo para a Babilônia. O que queres que eu faça com os vasos sagrados usados nas cerimônias do templo? E o Senhor lhe disse, pegue-os e deposite-os na terra, dizendo: ouça, Terra, a voz de seu criador que a criou e a encheu com suas águas, que a fundamentou com sete sinais para sete eras, depois disso irás receber vossos ornamentos. Guarde os vasos de cerimônia do templo até o momento do encontro dos adorados.
Independentemente desse texto ter sido escrito ou não pelo escriba Baruch, ele provava a existência de uma antiga tradição judia de que Jeremias conseguiu salvar ao menos alguns dos tesouros do Templo do ataque dos babilônios. Embora O Paralipomena não mencione especificamente a Arca ou qualquer outro vaso do Templo pelo nome, temos um parâmetro histórico que mostra que a Arca estava entre eles. Certamente, ao suspeitar que os babilônios iam invadir, Jeremias não teria ficado sem tomar atitudes e deixar que as relíquias sagradas dos judeus continuassem expostas no Templo para que fossem saqueadas.
Acima: Esquema de como seria o Templo de Salomão destruído por Nabucodonosor em 586 a.C.
Além disso, a menção na passagem de “vasos sagrados,” e não de apenas um “vaso”, fez-me mais uma vez pensar nos dois relatos do Antigo Testamento que falavam do ataque dos babilônios no Templo. A lista dos artefatos apresentada ali é longa e detalhada, mas não faz nenhuma referência à Arca assim como também não menciona outros itens importantes que a Bíblia diz terem estado anteriormente no Templo: o altar de incenso dourado e o tabernáculo sagrado (a tenda que servia como um templo portátil durante a peregrinação dos israelitas pelo deserto).
Ela também não menciona o menorah, embora ele possa estar incluído na listagem do Antigo Testamento como um dos “candelabros”. Parecia-me quase impossível que os autores do Antigo Testamento tivessem se esquecido de mencionar o altar de incenso e o tabernáculo se eles estivessem no Templo para serem roubados junto com os outros recipientes. Parecia que alguém — ao que tudo indica, Jeremias — tinha se certificado de que, junto com a Arca, eles já tinham sido levados para um lugar mais seguro.
No entanto, se Jeremias tivesse escondido esses tesouros do Templo, por que não foram devolvidos quando os persas derrubaram os babilônios e o Templo foi reconstruído cerca de setenta anos mais tarde? O Antigo Testamento nos garante que todos os recipientes sagrados que os babilônios tinham levado, foram devolvidos pelos persas e voltaram a ser guardados no Templo de Jerusalém (Ez 1:7-11). Por que, então, não receberam a Arca e os outros itens desaparecidos? Quando, mais uma vez, examinei os relatos bíblicos da vida de Jeremias, uma resposta me foi sugerida.
Muitos judeus morreram durante a invasão babilônica de Jerusalém, e milhares de outros foram escravizados e enviados para o exílio na Babilônia. Jeremias, porém, não apenas sobreviveu, mas também foi capaz de evitar que fosse preso ou escravizado. Embora tenha sido inicialmente preso, ele foi libertado por ter cooperado com seus inimigos ao incentivar seu povo a não propagar aquele derramamento de sangue, e para que não usassem suas armas. Ele continuou em Judá por alguns anos antes de se mudar para o Egito, onde viveu até sua morte por volta de 562 a.C. Uma possível razão para que nenhum vaso do Templo, que ele pode ter escondido, tenha sido devolvido, pode ser explicada com sua morte antes de os babilônios partirem.
Talvez, na época em que o Templo foi reconstruído, nenhum dos sobreviventes sabia onde os tesouros estavam. Obviamente, Jeremias teria precisado de ajuda para transportar os pesados artefatos como, por exemplo, a Arca, mas seus ajudantes podem muito bem ter morrido durante a invasão babilônica, ou enquanto estavam escravizados, sem jamais terem revelado o segredo de sua localização. Infelizmente, O Paralipomena não nos deixou pista alguma quanto ao local do esconderijo de Jeremias usado para os recipientes do Templo.
Porém, ao continuar analisando o banco de dados, encontrei uma referência intrigante de uma antiga tradição dos judeus, de que Jeremias escondera os tesouros em uma caverna secreta. Tinha acabado de começar minha busca naquele arquivo, quando um dos funcionários do Santuário me disse que estavam encerrando as atividades do dia. Só tive tempo para tomar nota da fonte da referência em um pedaço de papel. Ao deixar o Santuário da Bíblia, olhei de relance para o papel em minha mão. A tradição de que Jeremias havia escondido os vasos em uma caverna secreta aparentemente vinha de uma antiga versão da Bíblia, compilada pelo bispo São Jerônimo do século IV. Evidentemente, uma antiga cópia da Bíblia de Jerônimo ainda existia na Igreja da Natividade na cidade de Belém. Decidi que pegaria o ônibus para ir até lá na manhã seguinte.
Tinha visitado Belém uns dois anos antes, mas tudo estava diferente. A pouco mais de dez quilômetros ao sul de Jerusalém, uma pequena cidade árabe que hoje situa-se na região palestina semi-autônoma ainda chamada de Israel. O lugar apresentara uma atmosfera bastante tranqüila durante minha primeira visita, mas isso foi antes dos atuais problemas. Provavelmente, teria sido melhor ter caminhado até Belém como os peregrinos tradicionalmente fazem, pois um congestionamento terrível formou-se na Estrada de Hebrom. Soldados israelitas estavam revistando todos os veículos em um posto de controle nos arredores de Jerusalém, e demorei quase três horas para chegar a meu destino. Quando o ônibus finalmente chegou a Belém, todos os passageiros e as bagagens foram mais uma vez revistados, dessa vez por oficiais árabes.
De acordo com a Bíblia, Belém foi a cidade onde aconteceu o nascimento de Jesus, e dizem que a Igreja da Natividade marca o lugar onde ele nasceu. Está situada na Praça da Manjedoura, no coração da cidade, e na última vez em que estive ali, o local estava cheio de turistas que entravam e saíam alegres de lanchonetes e lojas de lembranças. Muitos dos 20.000 habitantes árabes — metade dos quais é cristã e a outra metade muçulmana — ganham a vida com o comércio dos turistas, em especial a produção e venda de imagens da família sagrada. Aquele tinha sido um negócio lucrativo, mas eu duvidada que ainda o fosse. Ao invés das multidões de visitantes e grupos de peregrinos que eram guiados por freiras do Convento das Irmãs de São José da cidade e por monges do mosteiro franciscano próximo dali, a Praça da Manjedoura estava cercada por policiais palestinos armados. Não havia mais do que alguns poucos ocidentais no local.
Ocupando a maior parte da ala leste da praça, está a Igreja da Natividade, que foi erguida sobre o local do nascimento de Cristo. Parece mais uma fortaleza do que uma igreja, visto que, a atual estrutura, construída pelo imperador romano Justiniano, no século VI, foi fortificada pelos Cruzadores nos tempos medievais. Justiniano não foi o responsável pela igreja original; essa responsabilidade pertenceu ao primeiro imperador romano cristão, Constantino, o Grande, que a construiu em cima de uma caverna no fim do ano 320. Conta a história que a mãe de Constantino, Helena, informou-o, de forma confidente, que a caverna era o local da Natividade.
A Igreja da Natividade, em Belém.
Ela tinha recebido aquela informação de um eremita local. Ao me curvar para ter acesso pela única entrada da igreja, descobri que havia mais atividades do lado de dentro. A rotina continuava igual a de séculos atrás. Ao meu redor, os servos da igreja estavam ocupados acendendo incensos e velas e cuidando das flores: os sacerdotes gregos ortodoxos em suas túnicas pretas, os padres armênios em suas túnicas creme e roxo, e os monges católicos franciscanos com seus hábitos marrons com capuz. Todas as três denominações cuidam da igreja, mas por incrível que pareça, nenhum deles é o responsável geral.
Ao encontrar um monge franciscano que falava inglês, fiquei sabendo que a Bíblia de Jerônimo estava exposta em um armário de vidro na Gruta da Natividade. Localizada no subsolo, abaixo do altar superior, foi ali que dizem que Jesus nasceu. Na última vez em que estive ali, tive de ficar na fila por quase uma hora para ver a gruta. Dessa vez pude entrar sem enfrentar fila alguma e descer o lance de degraus estreitos que nos levam até o suposto local do nascimento de Cristo.
A gruta em si é uma caverna com pouca iluminação que tem um cheiro forte de fumaça de incenso expelida de bicos de gás pendurados nas paredes. A Bíblia nos diz que Jesus nasceu em um estábulo, embora a gruta não pareça em absoluto com a choça familiar onde imaginamos que a natividade tenha acontecido. Contudo, o fato de (teoricamente) Jesus ter nascido ali, tornou-se o tópico de inúmeros debates. Entretanto, os guias garantem aos visitantes que existem evidências suficientes de que a caverna foi usada como um estábulo no tempo em que dizem que Jesus nasceu.
O lugar exato onde acredita-se que o nascimento ocorreu, está marcado com uma estrela de prata sobre o chão, e traz a inscrição em latim que diz “Aqui Jesus Cristo nasceu da Virgem Maria”. No entanto, o que me chamou a atenção foi a caixa de vidro colocada contra a parede em uma lateral da estrela. Dentro dela estava a cópia da Bíblia de Jerônimo, aberta, como descobri, na página do evangelho de São Lucas que conta o nascimento de Cristo. Uma plaqueta logo abaixo, escrita em uma série de idiomas diferentes, informava aos visitantes que o livro data de cerca de 400 d.C. e é uma das Bíblias mais antigas do mundo.
Obviamente, eu não teria permissão para tirá-la da caixa. Mesmo que pudesse, teria de conhecer o latim eclesiástico do século IV para conseguir lê-la. Por sorte, um dos servos informou-me que havia uma cópia em inglês moderno da Bíblia de Jerônimo na biblioteca da igreja. No entanto, teria de esperar até que o único bibliotecário voltasse de seu horário de almoço. Por volta de quarenta e cinco minutos depois ele apareceu, mas era um padre ortodoxo que, obviamente, falava somente grego. Finalmente, consegui encontrar alguém para ser meu intérprete e consegui pedir a ele o que queria.
No final das contas, ele não se incomodou que eu folheasse o livro da maneira que precisava, mas minha tarefa parecia algo impossível; a obra tinha mais de mil páginas, e eu não fazia idéia por onde começar a procurar por uma referência a respeito de Jeremias ter escondido os tesouros do Templo em uma caverna. Por fim, fui ajudado pelo monge franciscano com quem falei quando cheguei na igreja, e não demorou muito tempo até que ele conseguiu chegar onde eu poderia encontrar o que estava buscando.
O monge me disse que a Bíblia de Jerônimo contém uma série de livros em seu Antigo Testamento que não estão incluídos nas atuais Bíblias Protestantes, como a versão do Rei James. Esses eram alguns dos chamados Apócrifos, os textos do Tanak dos judeus que a Igreja Protestante eventualmente decidira excluir. Um deles era conhecido como o segundo livro dos Macabeus, e foi ali que havia, de fato, uma passagem que falava de Jeremias ter escondido alguns dos vasos sagrados do Templo. Para minha surpresa, esses itens, na verdade, falavam da Arca. 2 Macabeus 2:4-8 descreve como, antes da queda de Jerusalém para os babilônios, Jeremias deixou a cidade com as três relíquias do Templo que não eram mencionados na lista do Antigo Testamento: o tabernáculo, o altar superior e a Arca da Aliança.
Ao que tudo indicava, Deus disse a Jeremias o que fazer: “O profeta (Jeremias), ao ser alertado por Deus, ordenou que o tabernáculo e a arca o acompanhassem.” O que era ainda mais surpreendente era que a passagem, na realidade, explica o que Jeremias fez com elas: Ele foi até a montanha onde Moisés subiu e viu a herança de Deus (o Monte Horeb, na Península do Sinai). E quando Jeremias lá chegou, encontrou uma caverna vazia e levou para lá o tabernáculo e a arca e o altar de incenso, e então trancou a entrada.
Ali, ao que parece, a Arca ficou: Em seguida, alguns dos que o seguiu, vieram para marcar o lugar; mas não puderam mais encontrá-lo. E quando Jeremias se deu conta, culpou-os dizendo: o local ficará desconhecido, até que Deus una a congregação dos povos e receba-os em sua misericórdia. Evidentemente, Jeremias decidiu que a Arca permanecesse escondida naquela caverna na montanha e fez questão de que ninguém mais soubesse sua localização exata.
Ao que parece, ele acreditava que era o desejo de Deus que o povo dos hebreus não mais possuísse aquelas relíquias sagradas, após terem transgredido as suas leis. Essa era uma descoberta impressionante: eu havia encontrado um texto antigo que não somente confirmava minhas suspeitas de que Jeremias tinha escondido a Arca, mas também revelava onde ele a tinha escondido. Contudo, eu precisava controlar minha excitação até que pudesse descobrir a idade e a autenticidade do relato de 2 Macabeus.
Voltei a Jerusalém, na Biblioteca Nacional, e fiquei sabendo que o texto, ao que se sabe, ganhou sua forma final durante o século II a.C. De qualquer forma, algumas de suas seções certamente aconteceram, ao menos de forma oral, no início do século I porque chegaram a ser citadas por Philo de Alexandria, um filósofo judeu grego e historiador que morreu em 40 d.C. Nenhuma versão em hebraico original do texto sobrevive, mas baseado em diversas referências do texto, acredita-se tratar de uma obra composta tirada de antigos documentos que datam de cerca de 130 a.C.
Ele não é, ao que parece, um relato contemporâneo, e portanto sua honestidade pode inspirar dúvidas. Contudo, pelo que pude descobrir, essa é a mais antiga referência de que se tem notícias a respeito da Arca da Aliança, além daquilo que é conhecido como o Antigo Testamento. Na realidade, essa é a única referência antiga acerca da existência do artefato que se refere, especificamente, ao esconderijo da Arca. Durante o tempo em que fiquei na Biblioteca Nacional, olhando os alunos e estudiosos ao meu redor, que examinavam com meticulosidade todos aqueles livros e olhavam com curiosidade para as telas dos computadores, percebi que muitos caçadores da Arca, antes de mim, devem ter se inspirado no livro de Macabeus.
Não posso ter sido o único a encontrá-lo. Ele, na verdade, revelava onde a Arca estava escondida — em uma caverna na “montanha onde Moisés subiu e viu a herança de Deus”. No Antigo Testamento, Moisés conduz os israelitas para longe da prisão no Egito, e depois de quarenta anos no deserto, entram naquilo que a Bíblia chama de Terra Prometida de Canaã. O próprio Moisés jamais chega a pisar em Canaã, mas pouco antes de morrer, sobe em uma montanha onde tem uma visão da Terra Prometida e revela os últimos comandos de Deus aos Israelitas. A Terra Prometida de Canaã, ao que parece, é aquilo que está implícito nas palavras “herança de Deus” no relato do livro de Macabeus.
Quase todos os livros guias da Terra Santa informam ao leitor, de maneira confidente, que a visão de Moisés da Terra Prometida aconteceu no Monte Nebo, hoje conhecido como Jebel en Neba, dezesseis quilômetros ao leste da extremidade norte do Mar Morto — um lugar que hoje está sob o reino da Jordânia. Na verdade, como eu suspeitava, muitos pesquisadores haviam visitado esse lugar na esperança de encontrar a Arca.
Houve, descobri mais tarde, uma série de expedições para Jebel en Neba em busca da Arca. A primeira dos tempos atuais realizada pela evangelista e exploradora americana Antônia Frederick Futterer, na década de 1920. Em 1981, uma expedição na região chegou a afirmar ter encontrado a Arca. Ela foi chefiada por um outro americano, Tom Crotser, de Winfield, Kansas. Ao que tudo indica, próximo a um mosteiro franciscano, que fica ao pé da montanha, Crotser e seus companheiros descobriram uma caverna que acreditavam ser o lugar descrito no relato de Macabeus. Eles declararam ter encontrado uma caixa dourada dentro da caverna que acreditavam ser a Arca perdida.
Por razões conhecidas só por eles, a equipe deixou-a onde ela estava e se recusou a revelar sua localização. Obviamente, a afirmação de Crotser foi recebida com descrença pelos arqueólogos. Fotografias da suposta descoberta foram mostradas ao famoso arqueólogo Siegfried Horn, que não ficou impressionado. Ao que tudo indica, as fotos coloridas de Crotser não apenas eram pouco nítidas, mas somente duas delas não mostravam absolutamente nada. Uma delas estava tremida mas mostrava o que parecia ser uma câmara com uma caixa amarela ao centro. A outra foto era um pouco mais nítida e nos dava uma boa visão frontal da caixa.
De acordo com Horn, a obra da caixa era tão uniforme que só poderia ter sido feita por uma máquina. Além disso, um prego que saía da parte de cima da caixa tinha, em sua opinião, uma cabeça de aspecto moderno. Ele concluiu que aquele parecia ser um artefato de fabricação recente. Após ler a respeito da descoberta declarada por Crotser, me senti tão cético quanto o professor Horn. Na verdade, quando consultei as referências bíblicas a respeito da montanha onde dizem que Moisés parece ter visto “a herança de Deus”, comecei a me perguntar se o relato do livro de Macabeus se referia, ou não, ao Monte Nebo.
Há três relatos no Novo Testamento das visões de Moisés da Terra Prometida, encontrados separadamente nos livros de Levítico, Números e Deuteronômio, e cada um deles indica locais diferentes do acontecimento: nos Montes Nebo, Abarim e Sinai. Deuteronômio 32:49 na verdade, fala em dois lugares, chamando os dois de Monte Abarim e Monte Nebo nas instruções de Deus para Moisés: “Sobe ao monte de Abarim, ao monte Nebo, que está na terra de Moabe, defronte de Jericó.” O autor parece considerar as duas montanhas como a mesma, ao passo que, na realidade, o Monte Nebo é a atual Jebel en Neba, a dezesseis quilômetros ao leste da extremidade norte do Mar Morto, enquanto o Monte Abarim é o atual Jebel el Hamra, a aproximadamente trinta quilômetros no extremo sul.
O autor não apenas afirmou por engano que Abarim e Nebo eram a mesma montanha, como também parecia acreditar que o lugar em questão ficava próximo a Jericó, que, na verdade, fica a quilômetros dos dois pontos. O Monte Nebo fica a trinta quilômetros de Jericó, e o Monte Abarim a mais de cinqüenta quilômetros de distância. Parece que o autor não conhecia absolutamente nada daquela região. Quem quer que ele fosse, deve ter começado a escrever muitos anos depois dos acontecimentos, e em um país diferente.
Embora o relato de Números do mesmo evento seja menos confuso, indicando somente o Monte Abarim, quando o autor resume o episódio no último versículo desse livro, ele revela seu total desconhecimento da topografia da área: Estes são os mandamentos e os juízos que mandou o Senhor por meio de Moisés aos filhos de Israel nas campinas de Moabe, junto ao Jordão, na direção de Jericó. (Nm 36:13) Nesse versículo, o autor, por engano, diz que Jericó fica na terra de Moabe. Moabe era um reino estrangeiro ao leste do Rio Jordão, ao passo que Jericó fica a vinte e quatro quilômetros a oeste do rio — bem dentro da antiga Canaã. O mesmo relato é encontrado no livro de Levítico, que também resume o episódio em seu último versículo. Ele diz que o evento aconteceu no Monte Sinai: “Estes são os mandamentos que o Senhor ordenou a Moisés, para os filhos de Israel, no monte Sinai” (Lv 27:34).
Estava bastante convencido de que a Arca da Aliança tinha sido tirada do Templo de Jerusalém pouco antes da invasão babilônica em 597 a.C, e que Jeremias era a pessoa mais indicada para ser o responsável pelo ato. Quem quer que a tenha levado, jamais a devolveu, e portanto, ela ficou escondida em algum lugar. O único texto antigo a indicar o nome do esconderijo, o relato do livro de Macabeus, era tudo o que me restava. Sua credibilidade não se mostrava tão fidedigna. Contudo, parecia bastante válido seguir a pista.
O problema é que eu tinha três possíveis localizações para investigar. Precisava decidir qual delas parecia ser a escolha mais provável do lugar da visão de Moisés da Terra Prometida. Como os dois relatos, Deuteronômio e Números, continham erros geográficos que não apareciam no livro de Levítico, esse relato do acontecimento no Monte Sinai parecia ser a melhor aposta. Quanto mais pensava no assunto, mais acreditava que o Monte Sinai era o lugar onde a Arca estaria escondida: era, afinal, onde sua história havia começado. Além do mais, a Arca do bem mais sagrado dos hebreus, que no tempo do Rei Salomão tinha de ser mantida somente sobre o solo mais santificado.
Acreditava-se de que o próprio Deus tinha instruído que o Templo fosse reconstruído especialmente para abrigá-la. Antes desse período, o local mais sagrado dos hebreus era o Monte Sinai. Com o Templo ameaçado, o Monte Sinai seria a próxima escolha lógica para o local de descanso da Arca. Tinha certeza que outros haviam chegado à mesma conclusão. Mesmo se isso fosse verdade, porém, entendia agora por que a Arca jamais fora encontrada: a verdadeira localização do local (a caverna) no Monte Sinai fora, há muito tempo, esquecida.